Segundo o FNUAP, o Ministério da Saúde deve “adotar e implementar as recomendações do seu próprio Relatório de Vigilância do HIV, através da promoção ativa de preservativos para todos, além dos principais grupos populacionais e com ênfase nos jovens, aliados à sensibilização para a prevenção do HIV para a população em geral”.
“Os esforços globais de prevenção do HIV devem prosseguir entre os principais grupos populacionais. Os preservativos devem ser amplamente disponibilizados a todos os homens e mulheres sexualmente ativos, independentemente da sua idade, e as pessoas devem ter os conhecimentos, as competências e o poder para os utilizar correta e consistentemente”, referiu a organização numa nota enviada à Lusa.
Coincidindo com o Dia Mundial de Luta contra o HIV e SIDA, a organização recorda que dados do próprio Governo “mostram um aumento acentuado da prevalência de HIV e de Doenças Sexualmente Transmitidas (DST) entre todos os grupos populacionais”.
Os dados mostram que o problema é particularmente grave entre mulheres grávidas e portadores DST, onde a prevalência aumentou dez vezes desde 2013.
“Entre as grávidas, o crescimento mais acentuado da prevalência do HIV foi em meninas entre os 15 e os 24 anos. Em Timor-Leste, o HIV é transmitido principalmente através do sexo”, recordou a FNUAP.
O comunicado coincide com uma polémica decisão da ministra da Saúde, Odete Belo, que ordenou que fosse retirada a recomendação de uso de preservativo de cartazes distribuídos pelo país para marcar o Dia Mundial de Luta contra a SIDA, por oposição “moral” ao que considera ser “sexo livre”.
Fontes do Ministério da Saúde confirmaram à Lusa que Odete Belo deu instruções para que fossem eliminadas dos cartazes as palavras “usa preservativo” tendo feito essa recomendação em declarações públicas em Díli.
As mesmas fontes explicaram à Lusa que Odete Belo declarou num fórum com estudantes em Díli a sua oposição e que “as pessoas iam apagar dos cartazes o preservativo”.
Odete Belo, que a Lusa tentou contactar várias vezes sem sucesso, disse que “os jovens têm que se deitar cedo e não andar para aí a ter sexo livremente”.
Vídeos e fotos enviados à Lusa mostram pessoas a pintar com tinta preta as palavras “usa preservativo” em alguns cartazes.
A postura da ministra foi já fortemente criticada, inclusive pelo secretário-geral do seu partido, Fretilin, Mari Alkatiri, que disse à Lusa que a ordem “não é racional”.
“Não é só contraproducente para o combate à SIDA, mas não é racional. Em todo o mundo já se provou que isto não funciona assim. Cada um pode ter as suas convicções religiosas. Isso educa-se em casa. Mas a posição do Estado é a posição do Estado”, disse.
O FNUAP recordou que “a forma mais eficaz de prevenir a transmissão sexual do HIV é usar um preservativo, correta e consistentemente”.
“Os preservativos, tanto masculinos como femininos, são um componente crítico numa abordagem abrangente e sustentável para a prevenção do HIV e outras infeções sexualmente transmissíveis”, sublinhou.
“Isto é particularmente importante em Timor-Leste, onde o conhecimento abrangente do HIV entre os jovens, o grupo etário com o risco mais elevado, é extremamente baixo (7,7% entre as mulheres e 14,6% entre os homens dos 15 aos 24 anos), e onde o estigma e a discriminação são generalizados e foram identificados como a principal barreira ao tratamento do HIV”, referiu.
Apesar de algumas melhorias nos últimos anos, as questões sexuais são ainda um assunto quase tabu em Timor-Leste, onde as tradições e a religião travam muitas das ações de prevenção, como saúde sexual ou até a distribuição de métodos de proteção, como preservativos.
A própria Comissão Nacional de Luta Contra a SIDA (CNCS), liderada até recentemente por um pastor protestante, é acusada de políticas desadequadas, não promovendo o uso de preservativos por toda a população, visando apenas populações consideradas de risco ou doentes já seropositivos.
Posturas conservadoras levam a que muitos jovens não tenham sequer a mínima informação sobre saúde sexual e que muitas mulheres tenham de procurar de forma escondida acesso a métodos de contraceção.
A crescente mobilidade económica da população implica que o acesso a trabalhadores sexuais, tanto em Timor-Leste como no estrangeiro, fez aumentar os riscos de DST.
Jovens, muitas vezes, admitem não ter conhecimentos sobre reprodução – sabem que estão grávidas numa fase avançada da gravidez -, com o poder masculino dominante na sociedade a ‘obrigar’ muitas vezes a mulher a ter relações sem qualquer proteção.
O estudo referido pela FNUAP mostra que Timor-Leste está a ver nascer uma “epidemia” de doenças sexualmente transmissíveis, especialmente HIV e sífilis, mas há ainda “uma janela de oportunidade” para, com políticas adequadas, mitigar e controlar a sua progressão.
“Os decisores e planeadores têm que garantir programas inovadores fortes, estratégicos para aumentar a prevenção, além do atual programa de testar e tratar”, refere-se no estudo ao qual a Lusa teve acesso.
“Isto requer também políticas progressivas – como preservativos – para todos e não apenas para populações alvo”, aponta-se.
Desenvolvido em colaboração entre o Ministério da Saúde timorense e a Organização Mundial de Saúde (OMS), o estudo baseia-se num inquérito e análise conduzida entre novembro de 2018 e março de 2019, com o maior número de locais de vigilância sentinela de sempre.
Os dados mostram um “forte aumento” na prevalência tanto de HIV como de sífilis, devido a um aumento no comportamento de risco das populações alvo analisadas.
LUSA/HN
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