Vacina é a esperança de muitos para o regresso à normalidade

17 de Dezembro 2020

O ano de 2020 ficou marcado pela pandemia da Covid-19, uma infeção respiratória viral que fez correr o mundo sobressaltado atrás de uma vacina, descoberta e administrada em tempo recorde na esperança de um regresso à vida normal.

Em menos de um ano, as primeiras vacinas experimentais para a Covid-19, doença declarada em 11 de março como uma pandemia, foram aprovadas e administradas, ao mesmo tempo que prosseguem os ensaios clínicos finais, que terão de clarificar dúvidas que subsistem, como a duração da imunidade conferida ou possíveis efeitos indesejáveis a longo prazo, apesar de as taxas de eficácia anunciadas serem superiores, na maioria dos casos, a 90%.

O Reino Unido, o segundo país europeu mais atingido pela Covid-19, iniciou a sua campanha de vacinação em 08 de dezembro: a primeira pessoa a ser inoculada com a vacina experimental da Pfizer/BioNTech, para a qual o país aprovou o seu uso de emergência em 02 de dezembro, foi uma mulher de 90 anos, faixa etária de risco.

Cerca de uma semana depois, seguiram-se os Estados Unidos, país mais afetado pela pandemia e onde a primeira pessoa que obteve a mesma vacina foi uma enfermeira, incluída na lista dos profissionais mais vulneráveis à Covid-19. No vizinho Canadá, a “estreante” foi uma funcionária de um lar de idosos.

Antes, em 05 de dezembro, a Rússia, numa disputa a fazer lembrar os tempos da Guerra Fria, começou a dar a polémica Sputnik V a milhares de médicos, professores e outros grupos de risco em dezenas de centros em Moscovo.

A candidata russa, que deve o nome Sputnik ao primeiro satélite enviado para o espaço, gerou desconfiança na comunidade científica, uma vez que foi aprovada e registada pelas autoridades do país no verão, antes de arrancarem os devidos testes de eficácia com milhares de voluntários.

Esta vacina experimental induz a criação de anticorpos contra o coronavírus da Covid-19 através de dois adenovírus humanos geneticamente modificados para transportarem a proteína da espícula do SARS-CoV-2, a proteína que serve de “porta de entrada” do novo vírus nas células respiratórias.

Os dois adenovírus (tipo de vírus que, no caso, é inofensivo porque perdeu em laboratório a capacidade de se replicar) são injetados com três semanas de intervalo.

A farmacêutica britânica AstraZeneca, que está a testar uma vacina para a Covid-19 baseada na mesma tecnologia de adenovírus inativados, mas de chimpanzés, em parceria com a Universidade de Oxford, anunciou recentemente que vai começar em breve a investigação da combinação da sua vacina experimental com a Sputnik V para aumentar a sua eficácia.

A vacina desenvolvida pela farmacêutica norte-americana Pfizer e pela parceira biotecnológica alemã BioNTech usa a tecnologia de engenharia genética do ARN mensageiro, pela primeira vez aplicada na produção de vacinas.

O ARN mensageiro, molécula que no organismo está envolvida na síntese de proteínas, foi trabalhado em laboratório para instruir células saudáveis a fazerem cópias da proteína-chave do coronavírus, a proteína da espícula, estimulando o sistema imunológico a gerar anticorpos neutralizadores do SARS-CoV-2.

São necessárias duas doses da vacina Pfizer/BioNTech para garantir uma imunização. Não tendo ainda sido testada em grávidas e crianças, a sua administração não é recomendada a estes grupos, assim como a alérgicos graves.

Portugal, à semelhança de outros países da União Europeia, espera iniciar a campanha de vacinação no início de janeiro, ou mesmo antecipá-la uns dias, depois de obtido o aval da Agência Europeia do Medicamento, à qual o Reino Unido deixou de estar vinculado após o ‘Brexit’ (saída da União Europeia).

A autoridade máxima do medicamento na Europa deverá pronunciar-se sobre a vacina Pfizer/BioNTech em 21 ou 29 de dezembro. Em 12 de janeiro, será a vez da candidata da empresa de biotecnologia norte-americana Moderna.

Ambas as vacinas experimentais exigem a toma de duas doses, com intervalos que variam entre três e quatro semanas, e assentam na tecnologia do ARN mensageiro, mas requerem, pelos seus compostos, condições de refrigeração distintas: a da Pfizer/BioNTech tem de ser conservada a temperaturas de 70ºC negativos dias antes de ser usada, enquanto a da Moderna pode ser mantida durante seis meses a uma temperatura de -20ºC.

Em condições normais, uma vacina demora, em média, 10 anos a ser produzida e o período para estar disponível para ser usada em massa varia, por norma, entre um ano e ano e meio, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

O desenvolvimento de uma vacina — que induz a produção de anticorpos específicos contra um agente infeccioso como o coronavírus SARS-CoV-2 — leva tempo porque tem de passar por sucessivos testes de segurança e eficácia, um processo que foi significativamente acelerado com a Covid-19, uma emergência de saúde pública internacional desde 30 de janeiro.

A primeira vacina candidata para a Covid-19 começou a ser testada em humanos, com uma rapidez considerada sem precedentes, em 16 de março, nos Estados Unidos, pela “mão” da Moderna. Outras se seguiram.

Em 10 de dezembro, segundo os dados mais recentes da OMS, havia 52 potenciais vacinas em ensaios clínicos, 13 das quais na fase final, a que antecede a autorização de comercialização.

Para ganharem tempo, as farmacêuticas arriscaram em simultâneo com a produção e com testes clínicos de fase inicial, intermédia e final para aferirem a segurança e eficácia das suas vacinas experimentais, antes de pedirem autorização para o seu uso de emergência (concedido de forma mais rápida).

Os governos dos países mais ricos apressaram-se, por sua vez, a reservar lotes, mesmo antes de se conhecerem os primeiros resultados de eficácia das vacinas candidatas mais avançadas.

Para que ninguém ficasse para trás, incluindo os mais pobres, a OMS apadrinhou a rede internacional Covax, que pretende assegurar o acesso equitativo a uma vacina contra a Covid-19.

A esta rede aderiram, nomeadamente, a Comissão Europeia, que contratualizou seis vacinas, incluindo as da Pfizer/BioNTech, da Moderna e da AstraZeneca/Oxford, todos os países africanos e a China, onde foi detetado em dezembro de 2019 o novo coronavírus e que em julho de 2020 autorizou o uso de vacinas experimentais em pessoal médico e funcionários para “casos de emergência”, embora tenha alargado posteriormente à restante população sem que nenhuma empresa tenha ainda licença para comercialização.

A Covax, codirigida pela Aliança Global de Vacinas, agência da ONU presidida pelo ex-primeiro-ministro Durão Barroso, quer distribuir dois mil milhões de doses até ao final de 2021.

O laboratório francês Sanofi e o britânico GSK, com os quais a Comissão Europeia assinou também contratos, anunciaram que disponibilizarão à Covax 200 milhões de doses da sua vacina, em fase de testes menos adiantada.

Especialistas da OMS defendem que a vacinação contra a Covid-19 deve ser estimulada pela persuasão e pelo diálogo com as populações, e não deve ser obrigatória.

Em Portugal, a vacina será gratuita, facultativa e dada pelo Serviço Nacional de Saúde. Com a esperança de se alcançar a tão ambicionada imunidade de grupo, garante de um regresso à vida normal, sem máscaras, sem confinamentos, sem isolamentos.

Até quarta-feira, a pandemia da Covid-19 provocou mais de 1,6 milhões de mortos resultantes de mais de 73,4 milhões de casos de infeção em todo o mundo, segundo o balanço feito pela agência noticiosa francesa AFP.

LUSA/HN

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