“As especificidades de um bloco de partos são diferentes. Há um risco imprevisível de complicações e essa emergência põe em risco a mãe e o bebé”, disse Sara Proença, da delegação da FNAM que hoje foi ouvida pela Comissão Parlamentar de Saúde.
Na audição – a pedido do PCP sobre a reorganização dos serviços de urgência de Ginecologia e Obstetrícia, na região de Lisboa e Vale do Tejo, dos serviços de urgência de Psiquiatria a nível nacional e dos serviços de urgência geral – a profissional de saúde sublinhou a escassez de recursos humanos e insistiu: “ Há 10 anos (…) as equipas eram compostas pelo dobro dos elementos”.
A especialista sublinhou a “carga gigante” de trabalho que os profissionais destas duas áreas (obstetrícia e ginecologista) têm, lembrando que os hospitais privados “apresentam condições remuneratórias mais atraentes e sem esta carga de horas extra”.
“Um bloco de partos exige um serviço de anestesia diferenciado, serviço de sangue, enfermeiros especialistas em saúde materna em número suficiente e neonatologia”, exemplificou, dizendo que a falta de recursos humanos faz com que haja “médicos com dois anos de especialidade que chegam a um bloco de partos diferenciado e têm de ser chefes de equipa”.
Referindo-se ao excesso de horas extraordinárias que estes profissionais fazem, deu o seu exemplo: “Neste momento tenho 120 horas extra. Ainda faltam três dias para acabar a semana e vou fazer mais 48 horas. Por estar aqui hoje vou ter de trabalhar amanhã 30 horas de seguida”.
Sobre a proposta de Rede de Referenciação Hospitalar em Obstetrícia, Ginecologia e Neonatologia, que está em consulta pública, disse que “está desatualizada” e exemplificou, com dados relativos ao primeiro semestre de 2022.
“No ano passado, a MAC [Maternidade Alfredo da Costa] tinha 56 especialistas, dos quais 21 com mais de 55 anos [podem não fazer urgências], neste momento tem 41. O Santa Maria tinha 36 e agora tem 22, dos quais 11 com mais de 55 anos. O Hospital Fernando da Fonseca tinha 38 especialistas e tem 18, oito deles com mais 55 anos”, afirmou.
Apontou ainda as exigências da portaria que define o número de especialistas necessários em cada bloco de partos, assim como o número de horas extra que os profissionais do Serviço Nacional de saúde têm acumulado, para concluir: “Ninguém aguenta”.
“Temos tarefeiros que nem sabemos de onde vêm, se tem cursos assegurados pelos colégios da especialidade”, disse, a propósito da segurança necessária para o trabalho destas equipas, contrapondo: “Nos privados, as urgências são asseguradas por dois especialistas e (…) cada grávida leva o seu médico privado”.
Ainda sobre o trabalho nos blocos de partos no setor privado, acrescentou: “tudo isto condicionado pela disponibilidade do plafond dos seguros. Muitas não têm seguro que cubra tudo, sobretudo as potenciais emergências que possam ocorrer”.
“Quando há situações de alto risco, vai tudo para hospital público”, insistiu.
Sobre a possibilidade de funcionamento rotativo, como tem acontecido em Lisboa e Vale do Tejo, afirmou: “fechar uma urgência e mobilizar profissionais que estão naquele serviço… ninguém vai querer sair do seu serviço para ir trabalhar para uma urgência num hospital que não conhece”.
“Isto não funciona em rede”, sublinhou, dando como exemplo o seu trabalho no verão do ano passado: “Recebi no verão do ano passado grávidas de todo o país e ninguém veio fazer urgências das urgências que estavam encerradas”.
Além disso, insistiu, “nenhum médico é obrigado a ir prestar trabalho num serviço urgência onde não esteja vinculado”.
NR/HN/LUSA
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