O estudo foi realizado por uma equipa de investigadores do Centro de Investigação em Economia e Gestão e docentes da Faculdade de Economia que analisou dados de 123 mil pessoas com 50 ou mais anos de idade, de 28 países (da União Europeia, exceto Irlanda, e incluindo Suíça e Israel).
A equipa de investigação, composta por Carlota Quintal, Micaela Antunes, Luís Moura Ramos e Óscar Lourenço, apresenta uma relação entre necessidades de cuidados de saúde não satisfeitas na primeira vaga da pandemia, em 2020, e o reporte de diagnóstico de cancro em 2021.
Através da análise dos efeitos das necessidades de cuidados de saúde não satisfeitas (NNS) em 2020 no estado de saúde das pessoas em 2021, a investigação chama a atenção para a forma como as crises pandémicas podem impactar os sistemas de saúde, em particular o diagnóstico de doenças graves.
De acordo com a equipa de investigação, “no caso concreto da pandemia de covid-19, os níveis de NNS em 2020 atingiram valores sem precedentes”.
“Além do medo da infeção pelo SARS-CoV-2, que afastou as pessoas dos serviços de saúde, estes serviços também cancelaram inúmeros cuidados de saúde programados”.
A equipa analisou três motivos para a ocorrência de NNS, nomeadamente “consultas médicas agendadas que foram adiadas (o motivo mais prevalente, com 25% a 12% das pessoas a relatarem pelo menos uma situação entre 2020 e 2021, respetivamente)”, a “desistência de algum cuidado de saúde por medo da covid-19” e a “solicitação de consulta não atendida”.
No estudo, “não se sugere que as NNS resultaram em cancro, mas sim que as pessoas deixaram de fazer exames em 2020 que afinal eram pertinentes e que, possivelmente, tiveram um diagnóstico tardio”.
No entanto, “os resultados revelam que os sistemas de saúde não negaram a prestação de cuidados a quem apresentava maior risco de vida”, referiram os investigadores.
“Encontrámos uma associação negativa entre NNS e mortalidade, o que parece indicar que os sistemas de saúde priorizaram doentes mais graves, mostrando a capacidade de identificar os indivíduos que corriam maior risco de vida e dar-lhes acesso prioritário, mesmo num contexto adverso e inédito”, explicaram.
E, de acordo com os resultados da análise, “em 2021 as chances de novos diagnósticos de cancro são maiores entre os indivíduos que tiveram cuidados de saúde cancelados, negados ou que por medo faltaram às consultas ou exames em 2020”.
Os investigadores clarificaram que, neste estudo “não é sugerido que estas consultas ou exames pudessem ter evitado o diagnóstico de cancro, mas sim que se estas pessoas não tivessem experienciado necessidades de cuidados de saúde não satisfeitas em 2020 poderiam ter recebido o seu diagnóstico mais cedo”.
“No caso do cancro, o tempo é fundamental para a morbilidade e mortalidade associadas”, sublinharam.
No que respeita ao contexto português, dados de um outro estudo conduzido pela mesma equipa de investigação apontam que 60% dos indivíduos inquiridos “tiveram pelo menos uma NNS, sendo o cancelamento por parte dos serviços de saúde o motivo mais frequente”.
“Tendo em conta a magnitude do fenómeno das NNS em Portugal na primeira vaga da pandemia, os resultados relatados devem ser causa de preocupação, pois fazem-nos acreditar que tivemos casos de diagnóstico de cancro tardio”, alertaram os investigadores.
Neste âmbito, consideraram que “uma lição para o futuro é a necessidade de equilibrar mais a atenção dada aos doentes afetados pela pandemia e aos restantes”.
“E, dentro destes últimos, não descurar cuidados preventivos com maior potencial para afetar a sua saúde”.
LUSA/HN
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