“Estamos a falar de uma pessoa que chega a um hospital numa situação de crise, que durante o internamento se percebe que é uma situação que vai evoluir negativamente e que é referenciada nessa situação de crise. Por isso, o tempo para encontrar resposta é curto e, no meio da burocracia para a referenciação para a rede [nacional de cuidados continuados], quando chega a vaga, a pessoa já faleceu”, explicou a presidente da APCP, Catarina Pazes.
Este problema foi apontado este ano num relatório da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), que analisou o acesso e concluiu que, no ano passado, quase metade dos utentes indicados para unidades de cuidados paliativos contratualizadas com o setor privado ou social morreram à espera de vaga.
Segundo o relatório, a taxa de camas ajustada por 1.000.000 habitantes fica “aquém do limiar recomendado pela Associação Europeia para Cuidados Paliativos”, que varia entre 80 e 100, abrangendo tanto o contexto hospitalar quanto o de cuidados continuados.
Questionada pela Lusa, Catarina Pazes respondeu que, muitas vezes, não significa só que não haja vagas, mas também que “não houve o planeamento ao longo da vida deste doente, que permitisse uma referenciação mais atempada e a previsão de que essa necessidade existia”.
Lamentou que este acompanhamento que integre os cuidados paliativos ao longo do percurso da doença não esteja assegurado e explicou: “Estou a falar do acompanhamento pela especialidade, por uma consulta de especialidade, ou por uma equipa especializada que dá um suporte a este momento e a esta família em todas as situações de crise ou de necessidades mais complexas”.
“Acontece por falta de equipas e acontece por falta de formação”, considerou, acrescentando: “Uma abordagem paliativa depende de todos os profissionais, não depende apenas de equipas especializadas em cuidados paliativos”.
No verão, após o relatório da ERS, a Associação Nacional de Cuidados Continuados veio manifestar surpresa com as conclusões, revelando que há unidades com camas de cuidados paliativos vagas que não são solicitadas.
Contou que algumas das suas associadas se queixam, há alguns anos, das baixas taxas de ocupação destas camas.
Catarina Pazes insistiu que os profissionais de saúde que acompanham o doente têm de ter algumas competências nesta área para que identifiquem as necessidades da pessoa e garantam uma referenciação “precoce e atempada”, onde quer que o doente esteja, o que pode acontecer também em casa.
“Não acontece nada disto, o que acontece é que, por um lado, estão doentes à espera de vaga que não chega a tempo e, por outro, estão camas vazias. (…) Não é só uma desorganização, é também um paradigma da prestação de cuidados, que é tudo em cima da hora”, afirmou, acrescentando que “a referenciação para cuidados paliativos não deveria acontecer numa situação de crise mas sim ser planeada com o doente e a família.
Além de equipas especializadas nas unidades que prestam cuidados paliativos (fora dos hospitais) – com psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e médicos – “precisamos de ter fármacos adequados e de ter o acesso aos fármacos no imediato, para podermos atuar em tempo útil e adequado para a pessoa estar confortável”, defendeu a responsável, admitindo que o financiamento destas camas possa não estar adequado.
“Se calhar não está adequado àquilo que são os custos por doente e acaba por não ser uma área apelativa para quem abre este tipo de unidades, mas é uma explicação que eu remeto precisamente para quem gere estas unidades”, acrescentou.
Em agosto, o presidente da União das Misericórdias Portuguesas disse que a falta de vagas de cuidados paliativos e continuados em Portugal é um problema antigo, lembrando que o setor social está disponível para corrigir desde que existam apoios.
LUSA/HN
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