Mais de 24% das crianças partilham quarto com pais e 18,5% dormem na mesma cama

13 de Março 2025

Mais de 24% das crianças partilham o quarto com os pais e 18,5% dormem na mesma cama, revela um estudo da Associação Portuguesa de Sono (APS) que quer alertar para os riscos do sono insuficiente e de má qualidade.

“A maneira como se dorme nos primeiros dois anos tem muita repercussão no futuro. É importante corrigir o mais precocemente possível. Atualmente temos pais exaustos, cansados e crianças agitadas e esta é uma bola de neve que é difícil tornar mais pequenina”, alerta a pediatra Marta Rios, autora do estudo “Onde dorme o seu filho?”.

Em entrevista à agência Lusa, na véspera do Dia Mundial do Sono que se assinala na sexta-feira, Marta Rios, médica no Centro Materno-Infantil do Norte (CMIN) da Unidade Local de Saúde de Santo António (ULSSA), no Porto, sublinha que “é preciso criar limites e rotina”.

O estudo, realizado através de um questionário partilhado nas redes sociais e por associações de pais de todo o país, revelou que quase uma em cada quatro crianças divide o quarto ou a cama com os pais.

A análise decorreu ao longo de três meses e envolveu pais de crianças dos zero aos 12 anos. Foram consideradas 1.971 respostas válidas.

Os dados revelaram que 24,2% das crianças partilham o quarto com os pais, enquanto 18,5% dormem na mesma cama.

Entre os principais motivos apontados pelos pais para essa prática, 24,5% referem que os filhos acordam frequentemente durante a noite, 26,2% afirmam sentir-se mais seguro ao tê-los por perto, enquanto 23,2% mencionam dificuldades das crianças em adormecer.

“Estes dados mostram que uma percentagem significativa de crianças dorme no quarto ou na cama dos pais, muitas vezes devido a dificuldades em adormecer ou despertares noturnos frequentes. Estes hábitos, embora compreensíveis, podem impactar a qualidade do sono infantil e até mesmo a dinâmica familiar”, refere a pediatra.

Admitindo que a partilha de quarto e/ou da cama é um tema “controverso”, um tema sobre o qual Portugal ainda tem poucos dados, Marta Rios diz não ter ficado surpreendida com os resultados do questionário, feito em outubro do ano passado, mas mostrou-se “no mínimo um bocadinho preocupada”.

“Sabíamos que na Dinamarca ou em França, por exemplo, a percentagem anda à volta dos 30%. Na Itália só à volta dos 6%. A expectativa [sobre Portugal] era que estivéssemos no meio e foi o que se verificou. Fico um bocadinho preocupada porque (…) um quarto dos pais diz que faz isto porque a criança não dorme bem ou tem dificuldade em adormecer ou tem muitos despertares e isso já não é uma vontade dos pais, nem uma questão cultural”, analisa.

Marta Rios, que faz parte da direção da APS, sublinha que a qualidade do sono na infância é determinante para o desenvolvimento físico e cognitivo das crianças e sublinha que “há idades chave, nas quais é importante prevenir”.

Desde logo aos quatro/seis meses de idade, a fase em a criança começa a aprender a adormecer-se.

“É muito importante que o faça de forma independente do adulto”, frisou, acrescentando que a interação nos despertares deve ser mínima.

“As crianças cada vez mais adormecem ou no colo ou a mamar ou a beber o leite. O sono só é regulado pela sensação de fome/saciedade nos primeiros dois meses. Depois é preciso separar o que é mamar ou comer do que é dormir”, diz.

Salvaguardando que defende “muito colo e muito mimo”, Marta Rios sugere que a criança seja acalmada no colo e colocada no berço sonolenta mas com a noção de que vai adormecer no mesmo sítio onde vai estar ao longo da noite.

Outro aspeto sublinhado como fundamental prende-se com as horas de sono e com a necessidade de as crianças dormirem a sesta mesmo quando já frequentam o infantário.

“As crianças mais pequeninas têm sono mais cedo. Mas as rotinas dos adultos e dos irmãos mais velhos cada vez mais prolonga a hora de chegar a casa e as crianças pequeninas são arrastadas por esse ritmo. Na idade pré-escolar, é importante haver rotina calma de pré-adormecimento com tempo de mimo e atenção (…). Entre os três e os cinco anos, as crianças ainda precisam de dormir a sesta. Temos um problema em Portugal porque muitos infantários públicos e até privados não têm esse hábito”, lamenta.

A partir dos seis anos, vêm ao de cima os medos com perigos reais como incêndios, ladrões ou que aconteça alguma coisa aos pais e Marta Rios sugere que estes medos não sejam desvalorizados e dá dicas, como verificar com a criança que as portas e janelas estão fechadas, mostrar-lhes que os pais são saudáveis.

Quanto aos ecrãs, Marta Rios é perentória: “São péssimos para o sono porque a criança fica estimulada e diminuem a produção de melatonina que é uma hormona importante para induzir o sono ao longo da noite”.

lusa/HN

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