Relatora da ONU favorável à substituição do termo lepra devido ao sofrimento que causa

29 de Janeiro 2022

A primeira relatora especial das Nações Unidas contra a discriminação das pessoas com lepra é favorável à substituição do nome da doença, pois esta muitas vezes é usada como metáfora, causando grande sofrimento nas pessoas afetadas.

Alice Cruz, Relatora Especial da ONU para a Eliminação da Discriminação contra as Pessoas afetadas pela Lepra e seus Familiares, pediu, em 2018, aos líderes europeus para pararem de usar o termo “lepra” como metáfora.

Em declarações à agência Lusa, a relatora especial indicou que “há países e alguns grupos que rejeitam por completo o termo lepra”, pois “há cada vez mais evidências, através de estudos que foram feitos a partir da Bíblia, de que a lepra bíblica não corresponde à doença que foi classificada e descrita pela biomedicina”.

“A lepra era, digamos, um termo que aglutina várias doenças dermatológicas. A partir mais ou menos da década de 1950, muitas pessoas afetadas pela lepra começaram a dizer que tinha que se acabar com o termo lepra, tinha que substituir o termo lepra, porque o estigma estava associado a esse mesmo termo”, prosseguiu.

A própria Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou, em 2010, um conjunto de princípios e orientações para a eliminação da discriminação contra as pessoas afetadas pela lepra e seus familiares que, entre outros, defende que “os Estados devem eliminar a linguagem discriminatória, incluindo a utilização depreciativa do termo ´leproso` ou o seu equivalente em qualquer língua ou dialeto, de publicações governamentais e reverem rapidamente, sempre que possível, as publicações existentes que contenham esta linguagem”.

Segundo Alice Cruz, “há países que proibiram o uso do termo lepra”, como o Brasil, onde a doença é chamada de hanseníase.

Na semana passada, um juiz brasileiro determinou que o Presidente do país, Jair Bolsonaro, “se abstenha” de usar publicamente o termo “lepra” para se referir à doença hanseníase, por ser discriminatório, o que é regulado por lei.

No Japão, indicou Alice Cruz, a palavra lepra “não foi proibida oficialmente, mas faz parte das práticas, tanto do Estado, quanto dos serviços de saúde, utilizar a expressão doença de Hansen”.

“Há muitas organizações de pessoas afetadas pela lepra que também não utilizam a palavra lepra, utilizam doença de Hansen”, adiantou.

“Pessoalmente sou favorável à substituição. Agora, obviamente que isso é uma decisão que não é minha é uma decisão que, como está relacionada com processos identitários, tem que ser uma decisão das pessoas afetadas, que as restantes partes interessadas devem respeitar”, afirmou.

Para Alice Cruz, “a lepra é uma palavra tão forte e é uma palavra que ao longo do tempo se foi tornando num adjetivo, por isso tantas pessoas utilizam a palavra como metáfora”.

E acrescenta: “Eu acho que a maioria das pessoas, quando utiliza a palavra lepra (…), isso acontece efetivamente por ignorância e desconhecimento e sobretudo pela ideia, que está muito enraizada, sobretudo nos países do norte global, que a lepra já não existe, que é uma doença do passado, que é uma doença bíblica medieval”.

“Quando as pessoas estão alertadas para o facto de que existem muitas pessoas afetadas pela doença – pessoas que sofrem muito com a discriminação ou violência também, porque são de facto vítimas de violência interpessoal, sexual, psicológica – as pessoas são sensibilizadas”.

No próximo domingo assinala-se o Dia Mundial de Combate à Hanseníase (lepra), uma efeméride instituída em 1954 pelas Nações Unidas.

LUSA/HN

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