A 15 de Setembro celebra-se o Dia Internacional da Democracia, o regime político que tanto valorizamos e que permite a difusão dos valores que hoje consideramos basilares, como igualdade e liberdade. Se há 50 anos os jovens encabeçavam uma batalha por este sistema político através de movimentos estudantis e de uma participação eleitoral em peso, resta a pergunta de como a democracia é vivida atualmente. O estudo sobre a Participação Política da Juventude em Portugal, realizado pelo Fórum Gulbenkian Futuro em 2022, revela que, atualmente, os jovens demonstram interesse cívico de diversas formas que ultrapassam o modelo tradicional da ida às urnas de voto e que inclui ativismo online, campanhas, doações, angariação de fundos e petições. Existe notoriamente uma tendência para a mobilização social e para um objetivo primordial: a criação de impacto.
Também a 15 de setembro se celebra o Dia Nacional do Serviço Nacional de Saúde (SNS), aquele que é considerado o mais emblemático projeto do nosso sistema político. Refletir sobre a democracia passa por pensar o SNS e o seu futuro e ponderar o papel dos jovens e futuros profissionais neste setor. De facto, esta vontade juvenil de participar, ativamente, num processo de construção de uma sociedade mais coesa e sustentável cria um reflexo curioso – e vital -com a Saúde. Afinal, é o setor da Saúde que se define como uma área que está, intrinsecamente, orientada para os outros. Este reflexo deve, por isso, ser consequente: esta vontade de melhorar e habilidade de produzir resultados devem ser transpostas para o próprio Sistema de Saúde, nomeadamente, para dentro do SNS.
Contudo, a nossa realidade dificilmente espelha a nobreza dessa missão. Ao auscultar os profissionais de saúde, com destaque para a classe médica, notamos reclamações evidentes sobre a descaracterização do SNS. Fala-se de um sistema viciado sustentado num número excessivo de horas extraordinárias, na falta de oportunidades e tempo para a investigação e o estudo e da notória escassez de recursos humanos capazes de atender às necessidades dos serviços e às exigências formativas. Perante este cenário, poderemos facilmente entender o porquê de a Saúde não ser encarada como um bem comum, mas antes uma mera mercadoria, um trabalho com meia dúzia de indicadores a cumprir ao qual está associado um vencimento no final do mês.
A efetiva forma de influenciar positivamente a saúde das populações suscita um debate mais abrangente, no qual se podem (e, eventualmente, se devem) considerar reformas estruturais orientadas para a prevenção da doença e promoção da saúde. No entanto, existe um domínio consensual, no qual vale a pena investir: a aposta em critérios de qualidade formativa. Só assim garantimos que os profissionais, na sua plenitude, se sentem peças essenciais de uma máquina oleada que contribui para o desígnio primário de melhorar a vida da população e não apenas parte integrante de um sistema obsoleto. É crucial oferecer condições de trabalho dignas, salários justos e horários adequados para reter trabalhadores experientes e promover uma governação clínica eficaz. É necessário dotar os serviços de saúde com autonomia e incentivar um planeamento que permita a investigação clínica e o estudo autónomo, de forma a criarmos verdadeiros especialistas no sentido da palavra e não apenas no papel.
Por fim, perante uma revolução digital em curso na saúde, urge uma aposta na inovação. A inauguração, no nosso país, do primeiro escritório da Organização Mundial de Saúde dedicado à Tecnologia, Robótica e Empreendedorismo em Saúde representa um importante avanço e estabelece uma colaboração com o SNS e as instituições nacionais. No entanto, não podemos permitir a imobilização. No que concerne aos recursos humanos e voltando nosso olhar para além das fronteiras, deparamo-nos com recomendações que preconizam e incentivam clínicos, cientistas e especialistas do conhecimento a trabalharem com a Academia e/ou com a indústria tecnológica para o desenvolvimento e implementação de novas técnicas e tecnologias (Topol Review, fevereiro de 2023). Devemos antecipar as necessidades futuras e criar condições para que seja possível realizar investigação associada às novas tecnologias e promover o sinergismo clínico, sob o risco de ficarmos para trás e perdermos terreno na competitividade.
Acabo este texto numa nota positiva. A chama da participação cívica e da habilidade de trazer valor aos outros permanece acesa, como demonstrou a recente pandemia, onde os profissionais de Saúde estiveram na vanguarda, muitas vezes sob sacrifício pessoal. No entanto, não podemos deixar que este fogo seja extinto, perante o perigo de minar a confiança no sistema de saúde público. Faço um apelo aos órgãos governamentais e às lideranças para que apoiem o SNS da mesma maneira que seria desejável para a democracia: oferecendo oportunidades e estímulos suficientes para que a capacidade de criar um impacto seja uma realidade, uma necessidade que caracteriza os jovens e que deve ser incorporada neste setor vital da nossa sociedade, garantindo assim a sua sustentabilidade futura.
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