Numa entrevista à Lusa, o infetologista projetou que o país sul-americano vai superar 2 mil mortes por dengue em 2024, quase o dobro do registado no ano passado (1.094), quando as mortes provocadas pela doença atingiram o recorde da série histórica iniciada em 2000 pelo Ministério da Saúde brasileiro.
Além dos 830 óbitos já confirmados devido à doença este ano no país, há atualmente outros 1.269 casos suspeitos em investigação, de acordo com dados do painel de monitorização das arboviroses do Ministério da Saúde brasileiro.
Chebabo explicou que a dengue é um problema antigo, chegou a ser erradicada no meio do século passado no Brasil, mas o clima tropical (quente e húmido em várias regiões) associado à urbanização desorganizada das cidades, com muitas habitações precárias e graves problemas de saneamento básico, facilitaram a reintrodução da doença e a proliferação do seu vetor, o mosquito Aedes aegypti, a partir da década de 1980.
“Houve uma expansão [da dengue] pelo país, foi acontecendo gradativamente nesse século em todas as regiões. Além disso, houve a introdução de alguns vírus, sorotipos da dengue, que não circulavam há algum tempo e voltaram a circular como o sorotipo quatro (…) que voltou a circular no início desse século levando a surtos frequentes”, disse o presidente da SBI.
Questionado sobre a alta proliferação da dengue nos três primeiros meses do ano, que já atingiu 2,3 milhões de casos prováveis segundo estatísticas do Governo brasileiro, Chebabo afirmou não estar surpreendido, porque ele e outros especialistas já previam que isso poderia acontecer.
“Há mais de um ano estamos alertando que, dependendo das condições climáticas, teríamos um registo recorde de número de casos e de mortes no Brasil. E realmente é uma tempestade perfeita o que está acontecendo agora”, pontuou.
Chebabo lembrou também que, nos últimos anos, as políticas de saúde concentraram-se no combate à pandemia da covid-19, que, além de exigir políticas de saúde e recursos, também provocou o isolamento social, o que impediu que as autoridades fossem chamadas para controlar focos de Aedes aegypti, por exemplo, nas casas, prejudicando o enfrentamento do problema.
Além disso, o Brasil registou, já no ano passado, um número muito grande de casos e mortes fora da época de sazonalidade da doença. Normalmente a dengue circula com força nos meses quentes e chuvosos, ou seja, entre novembro a abril, porque o mosquito necessita de temperaturas altas e água para se reproduzir.
“O inverno passado não foi rigoroso, foi um inverno com temperaturas mais elevadas, que favorecem a replicação do mosquito (…) Já esperávamos que se esse verão, como se planeava, como se projetava, fosse um verão muito quente e chuvoso, por causa da questão climática, e teríamos um grande número de casos [de dengue] porque partimos de um patamar acima do esperado no inverno”, avaliou o infetologista.
“Associado isso ao aumento da área de expansão [da presença do mosquito e da doença], há municípios e estados vivendo o primeiro surto de dengue. Há secretários de saúde nos estados, nos municípios, sem experiência em manusear uma epidemia dessa proporção. Isso também leva a uma condição de atendimento ruim e certamente elevou o número de mortes causadas pela doença”, acrescentou.
Chebabo afirmou que houve uma antecipação da curva de proliferação da doença este ano, com um pico antecipado em cidades como Brasília e Rio de Janeiro, que já estão numa curva de queda.
O especialista disse ser muito difícil prever o avanço exato da doença devido à grande subnotificação, mas projetou um registo perto de 3 milhões e 3,5 milhões de casos prováveis em 2024.
“Nesse momento de epidemia, o que temos que ter é uma estrutura de atendimento à população para evitar danos maiores, que é a morte do paciente. Tem que ter uma estrutura adequada para atender a população, ao menos a demanda de atendimento dessa população na rede de saúde, que já é uma rede de saúde bastante saturada, para criar condições de atender rapidamente a população e reduzir as mortes porque qualquer morte por dengue é uma morte evitável”, concluiu.
LUSA/HN
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