A apenas poucos meses de decisivas eleições presidenciais, o ultraconservador Boiko Borissov, 61 anos, conta com a fragmentação da oposição para desvalorizar a deficiente abordagem do Governo face à crise sanitária, num cenário que não foi dominado pela campanha eleitoral mas antes pelos anúncios diários de mortes, acima da centenas nos últimos dias, e hospitais sobrelotados, numa situação fora de controlo.
Os apelos para um adiamento do escrutínio foram ignorados, tal como as medidas para permitir o voto à distância para as pessoas infetadas, prevendo-se uma elevada taxa de abstenção.
O país com sete milhões de habitantes, considerado o Estado-membro mais pobre da União Europeia (UE) – a adesão registou-se em 2007 a par da vizinha Roménia – permanece no último lugar na vacinação e entre os que registam maior taxa de mortalidade.
Os habituais atores da cena política interna voltam a disputar o poder num cenário de também crise económica grave, com destaque para os Cidadãos para um Desenvolvimento Europeu da Bulgária (GERB), o partido do primeiro-ministro que desde 2009 venceu quase todos os escrutínios e em junho próximo poderá ser o chefe de Governo búlgaro com mais tempo no poder.
Apesar da grave e endémica crise económica, agravada pela corrupção generalizada, Borissov conseguiu fazer aprovar algumas medidas populares (aumento do salário mínimo para 325 euros e do salário médio até 730 euros), enquanto se aguardam os novos fundos comunitários.
Ao registar pouco menos de 30% das intenções de voto, este partido conservador e de tendência populista tem cerca de cinco pontos de vantagem face ao principal rival, o Partido socialista búlgaro (BSP), que não conseguiu beneficiar do grande descontentamento popular que agitou a Bulgária desde o verão de 2020 devido a diversos escândalos de corrupção e a uma resposta incompetente face à covid-19.
Com pouco menos de 13% das intenções de voto surge a única surpresa, o partido Este Povo Existe (ITN), criado pela vedeta televisiva Slavi Trifonov, que disputa o terceiro lugar ao tradicional Movimento para os Direitos e Liberdades (DPS), representante da minoria turca e muçulmana do país, com 11% das preferências, segundo as sodagens.
O programa de “Slavi”, como é conhecido o apresentador, limita-se a propor o derrube do “modelo Borissov”, e a “dar o povo o poder”, incluindo através da instauração de um escrutínio maioritário.
As sondagens indicam ainda que a formação Bulgária Democrática, um pequeno partido que diz representar a “direita urbana e liberal” poderá pela primeira vez obter representação parlamentar, com pouco mais de 5% de votos.
De acordo com as previsões mais otimistas, será também o caso da Eclética Coligação “De pé!”, que nasceu durante os protestos do passado verão.
Neste confronto, e com cerca de 4% das intenções de voto, os ultranacionalistas do VMRO concorrem sozinhos, após o fim da coligação com duas formações de extrema-direita.
Em reposta aos casos de corrupção que atingiram diversos membros do Governo, incluindo Borissov, o primeiro-ministro denunciou uma “campanha de difamação” destinada a “sabotar as reformas e desviar a Bulgária do seu caminho euro-atlântico”.
Diversos observadores consideram que a vantagem do GERB se deve sobretudo à fraqueza dos seus opositores, em particular os socialistas, envolvidos em conflitos ideológicos e pessoais.
A dirigente do BSP, Kornelia Ninova, defende ideias radicalmente diferentes e mais conservadoras que as propostas pelo Presidente Rumen Radev, no entanto apoiado por este partido.
E a atual dirigente socialista também se afastou da figura tutelar do partido, Serguei Stanichev, que partiu para Bruxelas onde dirige o Partido Socialista Europeu (PSE).
O GERB parece ter “beneficiado” da crise sanitária, em particular na primeira vaga da passada primavera, ao surgir como uma “barreira” à pandemia, que na ocasião poupou consideravelmente a Bulgária.
Boiko Borrissov apresentava-se como o promotor das medidas “mais liberais de toda a Europa”, e permitiu que cafés, restaurantes, teatros e óperas permanecessem abertos, mas o “modelo búlgaro” de luta contra o coronavírus é agora questionado face a uma grave terceira vaga, com os opositores a acusarem o chefe do governo de responsabilidade pela crise sanitária.
O primeiro-ministro respondeu ao ordenar a vacinação de médicos, polícias e funcionários públicos, e abrir esta medida a toda a população, mas a única vacina disponível, e em quantidades insuficientes, é a controversa AstraZeneca.
Ao contrário de diversos países vizinhos, e ciente da sua fidelidade à UE e à NATO (adesão no alargamento de 2004), Borissov recusou a utilização da vacina russa ou chinesa, e envolveu-se recentemente num novo contencioso diplomático com Moscovo em torno de um alegado caso de espionagem, que implicou retaliações mútuas.
Apesar de manter uma dose de popularidade, as previsões indicam que o GERB será de novo forçado a garantir uma coligação. Os seus atuais parceiros (VMRO e extrema-direita) não serão suficientes, e Borissov poderá ser forçado a recorrer, de novo, ao “partido turco” (DPS, desprezado pelos ultranacionalistas), ou mesmo a “Slavi”, apesar da ambição deste novo protagonista em derrubar o atual poder.
No entanto, e na perspetiva de observadores locais, a aliança “contranatura” que poderá ser formada terá poucas hipóteses de uma longa vida. Apesar de também ser admitida a hipótese de que todos os opositores ao primeiro-ministro “esqueçam” as suas divergências em nome de uma alternativa há muito aguardada na Bulgária.
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