As férias são uma época em que “as pessoas querem relaxar, encontrar-se com familiares e amigos, estar fora de casa, conviver” e isso gera maiores aglomerações, aumentando o risco de contágio, disse à agência Lusa Carlos Robalo Cordeiro.
O turismo está a sofrer um acentuado decréscimo, apesar disso, haverá sempre visitantes estrangeiros, que, sobretudo oriundos de países mais afetados pela pandemia, são também fator de risco, nota o especialista.
Neste período, as pessoas preferem áreas abertas, como praia ou esplanadas, o que faz com que o risco de contágio não seja tão grande como nos espaços fechados, ainda assim continuará a haver doentes do novo coronavírus e o número de infetados não passará a ser insignificante, alerta.
Pelo contrário, os casos vão aumentar, prevê o também diretor do Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra e membro do Conselho de Escolas Médicas Portuguesas.
Embora permita mais afastamento físico entre as pessoas e promova a opção por áreas abertas, esta época “é de risco”, pois também é propícia ao relaxamento e ao exagero, sintetiza o pneumologista.
De todo o modo, Carlos Robalo Cordeiro está “mais preocupado com a fase seguinte”, com “o regresso das pessoas a casa, ao trabalho, à escola, aos transportes públicos”, com “centenas de milhares de pessoas em espaços fechados”, onde “as regras [estabelecidas pelas autoridades de saúde] são mais difíceis de cumprir”, a começar pelo afastamento social.
Tanto mais que – sabe-se agora – o vírus “pode manter-se em suspensão no ar durante algum tempo” e transmitir-se “através da fala normal”, sublinha.
“O perigo do verão é que, terminado este período de maior relaxamento, se tenha uma situação em que os hospitais não consigam comportar” os doentes necessitados de assistência, sustenta Robalo Cordeiro, destacando que, por isso, “é fundamental chegar a essa fase com números [de infetados] mais baixos do que os de hoje e com grande capacidade de fazer testes [à covid-19] rápidos” (obtenção de resultados num curto de espaço de tempo).
Simultaneamente, impõe-se que a vacina contra os vírus da gripe (ou influenza) seja administrada “o mais cedo possível, logo em outubro”, e não apenas a quem tem mais de 65 anos de idade, mas “também a todos os profissionais de saúde e funcionários de estruturas residenciais para idosos”.
Em relação ao vírus influenza, Portugal “não está muito mal, tem uma taxa de 61% de vacinação da população com mais de 65 anos”, embora a Organização Mundial de Saúde recomende para este grupo de risco 75%.
Para o nosso país ter alcançado aquela percentagem “contribuiu muito a gratuitidade, desde 2010, da vacinação contra a influenza”, para esta população, sublinha Carlos Robalo Cordeiro, defendendo, agora por razões acrescidas, o alargamento desta medida a grupos como grávidas e cidadãos com idades entre os 60 e os 65 anos – “seria muito importante”.
Mas se as pessoas com mais de 65 anos têm, em Portugal, uma taxa de vacinação contra a gripe satisfatória – designadamente quando comparada com as de outros países da Europa –, já em relação aos profissionais de saúde, ela “não chega a metade” (ronda os 49%).
É verdade que a pandemia em Portugal tem sido, de algum modo, controlada, que não foi necessário utilizar mais de 60% da capacidade dos cuidados intensivos, mas, salienta o pneumologista e membro do Gabinete de Crise da Ordem dos Médico, estes “foram reforçados” e trata-se de uma altura do ano em que “não há tantas doenças crónicas” como no outono e inverno.
Além disso, foram adiadas consultas e cirurgias, os utentes, eles próprios, evitaram ou tiveram mesmo medo de recorrer aos serviços de saúde e os profissionais do setor não estavam tão desgastados como estão agora.
“A gripe, só por ela, chega, por vezes, para provocar, nalguns locais, quase o caos”, adverte.
“Não nos vamos ver livres deste vírus tão cedo”, afirma o médico, referindo o caso da Austrália (que agora teve de voltar ao confinamento).
“A imunidade de grupo é uma miragem”, como reflete, por exemplo, um estudo recentemente efetuado em Madrid, que aponta para uma taxa de apenas 5%. Além de que essa imunidade, “tudo indica, não é permanente”, nem se sabe por quanto tempo se manterá.
Na região de Lisboa e Vale do Tejo, atendendo à atual situação, “é fundamental o reforço das estruturas de saúde pública”, alerta Carlos Robalo Cordeiro, considerando que a infeção deveria ser controlada, monitorizada e analisada, ali e no plano nacional, por comissões “talvez a nível de distrito” e de alguns setores.
Essas comissões não deveriam envolver apenas as autoridades de saúde, mas também outras entidades, como academias ou forças de segurança, porque “as realidades são muito diferentes de região para região”.
As academias, as sociedades científicas, as ordens profissionais deveriam, aliás, ser mais chamadas a participar na análise e definição de respostas para a situação, que exige que estejamos “todos juntos”, preconiza o especialista, frisando que, por exemplo, o Conselho de Escolas Médicas Portuguesas, que reúne as oito faculdades de medicina do País, não tem sido chamado a emitir opinião.
“Estamos a desperdiçar capacidade de ver e interpretar os dados”, conclui Carlos Robalo Cordeiro, apelando aos responsáveis políticos para que “oiçam mais quem possa ter uma visão científica, desinteressada, independente”.
LUSA/HN
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