Especialistas defendem vacinação da gripe para reduzir risco de outras doenças

25 de Fevereiro 2021

Os autores de um estudo que analisou as últimas 10 épocas gripais em Portugal defendem uma maior aposta na vacinação para reduzir o risco de consequências da gripe noutros órgãos, como por exemplo o coração.

“Já sabíamos de antemão, antes da covid, que várias doenças infecciosas, sejam elas provocadas por bactérias ou por vírus, podem ter influência do coração”, disse à agência Lusa o cardiologista Carlos Rabaçal, presidente do Conselho Estratégico da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.

O especialista recorda que a vacinação contra a gripe é “a primeira arma” e que deveria ser de acesso universal, fazendo inclusive parte do programa nacional de vacinação.

Aponta situações clínicas “claramente relacionadas com episódios gripais”, como as miocardites, que são inflamações do miocárdio (músculo cardíaco), doença que pode ser grave e que, muitas vezes, implica o internamento de doentes “particularmente jovens”.

“Eu vejo isso no meu serviço. A grande maioria das miocardites internadas no meu serviço, e quase que posso dizer nos hospitais do país, é de gente nova. E todos têm uma história mais ou menos idêntica, que é: estiveram com sintomas que pareciam claramente uma gripe, mas, depois de passarem, mais tarde, aparecem com queixas cardíacas”, explicou o cardiologista do Hospital de Vila Franca de Xira.

Carlos Rabaçal sublinha que muitos dos vírus do tipo influenza (que provoca gripes) “têm uma capacidade de invadirem o músculo cardíaco e, sem necessitarem de mais nada, provocarem doença que pode ser séria”.

“No ano passado tivemos uma miocardite fatal numa mulher jovem, de trinta e poucos anos, que era uma pessoa saudável” e que adoeceu depois de ter tido gripe, contou.

O especialista apontou ainda estudos internacionais que revelam que o risco de ter um enfarte agudo do miocárdio é 10 vezes superior nos dias seguintes à infeção por influenza e que o risco de ter um AVC (acidente vascular cerebral) é oito vezes superior, mesmo em pessoas saudáveis.

Disse ainda que o estudo realizado em Portugal mostrou que os picos de gripe e hospitalização por gripe coincidem com os picos de hospitalização por enfarte agudo do miocárdio, o que “reforça a importância de olharmos para a gripe enquanto infeção respiratória potencialmente grave e cujo impacto pode afetar, para além dos pulmões, também o coração e o cérebro”, disse.

Além de sublinhar a importância de estimular a vacinação – “o melhor meio de prevenir a gripe e as complicações com ela relacionadas” – Carlos Rabaçal afirma:” Sempre nos fez confusão, na altura das gripes, as urgências dos hospitais ficarem cheias de gente que vem pedir socorro e as pessoas ficam ali em cima umas das outras, sem máscaras”.

A este nível, disse esperar que as medidas de proteção impostas pela pandemia (máscaras, higiene das mãos e distanciamento físico) fiquem como hábito futuro.

“Espero que não esqueçamos. É efetivamente uma ferramenta extremamente importante para a prevenção da gripe e obviamente das complicações que ela pode trazer”, concluiu.

Neste momento, a vacina da gripe é fortemente recomendada pela Direção-Geral da Saúde (DGS) a pessoas de idade igual ou acima dos 65 anos, grávidas, doentes crónicos e imunodeprimidos, profissionais de saúde e outros prestadores de cuidados.

Na época gripal 2020/21 a vacina é gratuita nas pessoas com 65 anos ou mais, grávidas, utentes de lares e doentes da rede de cuidados continuados, abrangendo ainda algumas doenças crónicas como a diabetes, por exemplo.

Pode ser administrada mediante receita médica em todos os restantes cidadãos não incluídos nestes grupos, mas com uma compartição de 37%.

LUSA/HN

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

João Paulo Magalhães: É preciso investir na Prevenção, Organização e Valorização dos Médicos de Saúde Pública

João Paulo Magalhães, Vice-Presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, defende para o próximo Governo três prioridades essenciais para a Saúde Pública: reforço da promoção da saúde e prevenção da doença, modernização e clarificação da organização dos serviços de Saúde Pública, e valorização das condições de trabalho e carreira dos médicos de Saúde Pública

AICEP aprovou investimentos de 300 ME em quatro empresas

A Agência para o Comércio Externo de Portugal (AICEP) aprovou um pacote de investimento de mais de 300 milhões de euros, em quatro empresas, criando mais de 1.200 postos de trabalho, adiantou hoje o Governo.

Evoluir o SNS: Reflexão de Luís Filipe Pereira sobre o Futuro da Saúde em Portugal

Luís Filipe Pereira, ex-ministro da Saúde, analisa os desafios estruturais do SNS, destacando a ineficiência do Estado nas funções de prestador, financiador e empregador. Defende a transição para um Sistema de Saúde que integre prestadores públicos, privados e sociais, promovendo eficiência e liberdade de escolha para os utentes.

MAIS LIDAS

Share This
Verified by MonsterInsights