Na região Centro, donos de restaurantes, operadores do turismo ligado à natureza e apreciadores das iguarias à base de cogumelos enaltecem à agência Lusa o valor económico destas frutificações de fungos das florestas autóctones.
Natural de Penacova, distrito de Coimbra, Valdemar Rosas afeiçoou-se ainda criança à colheita, consumo e estudo desta riqueza natural, que se revela especialmente nos meses de outono e inverno, logo que surgem as primeiras chuvas.
“Com a família e os amigos, apanhávamos os míscaros e os tortulhos. Na minha aldeia, eram meses de cozinha farta e não precisávamos de carne”, recorda.
Reformado, o engenheiro eletrotécnico plantou mais de 400 árvores por sua mão, num terreno que possui em Travanca do Mondego, Penacova, junto ao rio.
“O meu objetivo é ter aqui os cogumelos que quero”, afirma Valdemar Rosas, explicando que “cada um deles vive em simbiose com a sua árvore” e que as plantações de eucalipto “estão a matar esta galinha dos ovos de ouro”.
Corroborando esta posição, o engenheiro florestal José Pais entende que a aposta no eucalipto “é um erro crasso” e preconiza “outras formas de olhar a floresta”.
Por exemplo, “um sobreiral não é só um sobreiral”, havendo uma interdependência entre a árvore e certos cogumelos, os quais integram o reino fungi, como os bolores e as leveduras.
Em 2020, o casal José Pais e Paula Oliveira abriu no concelho de Penela, arredores de Coimbra, a casa de campo Villa Chanca, unidade de turismo em espaço rural onde, entre outras iniciativas, ocorrem “experiências gastronómicas a partir dos cogumelos e plantas silvestres”.
“O turismo micológico é uma prática de conhecimento e afirmação dos restaurantes e hotéis do interior”, realça o empresário à Lusa.
Cada cogumelo comestível “é um alimento”. E a sua valorização, designadamente através da gastronomia e dos passeios micológicos, ajuda a “proteger as florestas autóctones e mais bonitas”, enfatiza.
“É mais uma estratégia para chegar à economia, que exige formação e muita informação”, adverte José Pais, que nesta época, além de ensinar, lidera programas de apanha de cogumelos em que também cozinha.
Oriundo do concelho de Cantanhede, José Reis é dono do restaurante Cantinho dos Reis, que funciona há 26 anos em Coimbra e que também serve cogumelos.
“Na minha infância, tínhamos um rancho melhorado quando o meu avô saía de madrugada para apanhar os míscaros da areia”, conta à Lusa.
As pessoas “adoravam esses míscaros” dos pinhais. Atualmente, “são muitos os clientes” apinhados no seu estabelecimento, no Terreiro da Erva, para saborearem o arroz de míscaros.
Contudo, José Reis prefere “não arriscar” em termos de segurança e passou nos últimos anos a comprar cogumelos produzidos em estufas da região.
“É uma tradição forte. Vem aqui gente de todo o lado comer míscaros”, sublinha.
Na Serra da Lousã, Joaquim Lourenço gere sete alojamentos e a Taberna do Talasnal, um antigo lugar agropastoril que integra a rede turística Aldeias do Xisto.
“Tenho sempre pratos que levam cogumelos comprados, mas os silvestres são os preferidos dos turistas. Só uso tortulhos quando os consigo arranjar”, revela à Lusa.
O dono da empresa confessa ter “muito receio de introduzir” o produto espontâneo nas ementas.
Na sua opinião, devia haver “uma entidade que identificasse os cogumelos, para não haver dúvidas” quanto à sua eventual toxicidade.
“É uma riqueza ainda por explorar na Serra da Lousã”, lamenta Joaquim Lourenço.
Luísa Sales, também da Lousã, participa habitualmente em ações de sensibilização e caminhadas micológicas.
“Os cogumelos são um belíssimo alimento e uma boa alternativa à carne”, salienta esta professora de Biologia e Geologia à Lusa.
A colheita e o consumo “têm de ser orientados por gente conhecedora”, recomenda.
Para Paulo Silva, gerente da empresa TransSerrano, que opera a partir de Góis nas áreas da aventura, lazer e turismo, “há hoje um novo interesse” pela micologia.
“Todas as atividades que tragam atividade económica ao interior são bem-vindas. Os cogumelos representam uma oportunidade de criar negócio e fixar pessoas”, sublinha.
Paulo Silva lidera também a Lousitânea – Liga de Amigos da Serra da Lousã, que, além de programas micológicos e outros, promove a habitual Corrida do Entrudo das Aldeias do Xisto, em que os foliões ostentam máscaras de cortiça.
LUSA/HN
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