Estudo revela que aumentou o número de pessoas a quem foi feito teste ao VIH sem o seu conhecimento

1 de Março 2023

Quatro em cada dez pessoas que vivem com VIH já foram alvo de algum tipo de discriminação social, revela um estudo nacional, que aponta um aumento do número de pessoas que realizaram o teste sem o seu conhecimento.

O Índice do Estigma das Pessoas que Vivem com VIH (Stigma Index), divulgado hoje em Lisboa, é um projeto internacional aplicado pela primeira vez em Portugal em 2013 e replicado em 2021/2022 pelo Centro Anti-Discriminação VIH (projeto conjunto da Associação Portuguesa para a Prevenção e Desafio à Sida – Ser+ e o Grupo de Ativistas em Tratamento – GAT), com financiamento da Direção-Geral da Saúde e parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública.

O estudo, em que participaram 1.095 pessoas que vivem com VIH, das regiões de Lisboa, Porto, Coimbra e Faro, realça como aspetos que parecem ter piorado desde 2013, a confidencialidade dos registos médicos e a atuação perante situações de discriminação.

Relativamente à decisão de fazer o teste, observou-se “um pequeno aumento” na percentagem de inquiridos que diz fazê-lo voluntariamente, de 51,3% em 2013 para 53,9% em 2021.

Mas o aumento “é ainda mais substancial” nos que referem que lhes foi feito o teste sem o seu conhecimento, subindo de 21,9% para 29,7%.

O diretor-executivo do GAT, Ricardo Fernandes disse à Lusa que, quanto à realização do teste sem o conhecimento dos visados, o inquérito não averiguou em que contexto foram feitos esses testes, mas considerou que surgem em situações como exames pré-cirúrgicos e também em exames de rotina prescritos por médicos de família.

Ricardo Fernandes considerou que esta situação é “gravíssima”, tendo em conta que o médico tem de justificar a prescrição deste rastreio.

Um terço dos inquiridos adiou ou evitou receber tratamento por razões relacionadas com estigma e discriminação e 22% reportaram alguma situação de discriminação nos últimos 12 meses por parte de profissionais de saúde, sendo mais frequente a sua ocorrência em serviços de saúde não relacionados com o VIH (16%).

“Quando analisados apenas os itens comparáveis entre 2013 e 2021 verifica-se que houve uma diminuição nas pessoas que experienciaram essas situações nos últimos 12 meses (de 11% para 7%)”, assinala o estudo, que assinala o dia da Discriminação Zero.

O incumprimento da confidencialidade aumentou de 5,3% para 9,5%, com os inquiridos a referirem que os seus registos médicos não são mantidos confidenciais, refere o estudo, que contou com a colaboração de 10 centros hospitalares e 18 organizações de base comunitária.

No último ano, 8,5% dos inquiridos revelaram ter sido alvo de algum tipo de discriminação social, sendo as situações mais relatadas os comentários discriminatórios e agressão verbal, quando em 2013 eram 29%, e 3,5% dizem já ter sofrido alguma situação de violação dos seus direitos.

A grande maioria (90,5%) identificou manifestações de estigma interno e 30% algum comportamento de auto-discriminação nos últimos doze meses, valores que baixaram face a 2013, estando estas questões mais presentes nos imigrantes, trabalhadores sexuais, pessoas trans e nas mulheres.

Analisando o “estigma e discriminação por motivos não relacionados com o VIH”, o estudo revela que as pessoas trans, utilizadores de drogas e homens que fazem sexo com homens são as que mais referem ser alvo de discriminação, com 88%, 77% e 65%, respetivamente.

“Apesar de os resultados deste estudo parecerem indiciar uma evolução favorável ao nível do estigma e da discriminação sofridos pelas pessoas que vivem com VIH nos vários contextos da sua vida, verifica-se que esta continua a ser uma questão bastante relevante em Portugal, especialmente nos serviços de saúde, atingindo desproporcionalmente pessoas pertencentes a uma ou mais populações vulneráveis, bem como mulheres”, salienta o estudo.

Ressalva ainda que os dados agora recolhidos poderão estar enviesados pela pandemia covid-19, que provocou uma diminuição das interações sociais nos 12 meses anteriores à aplicação do questionário, podendo ter originado um decréscimo artificial das situações de discriminação.

O Relatório faz um conjunto de recomendações ao Parlamento, ao Governo e às organizações não-governamentais que atuam nesta área a nível legislativo e de estratégias de intervenção, como “monitorizar, acompanhar e atuar perante situações de estigma e discriminação no âmbito da infeção VIH” ou “assegurar o direito à saúde sexual e reprodutiva sem discriminação”.

LUSA/HN

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