Casos de lepra são raros mas ainda aparecem em Portugal

29 de Janeiro 2022

São raros, mas todos os anos chegam à consulta de doença de Hansen no Hospital dos Capuchos, em Lisboa, casos de doentes com lepra provenientes de países onde a doença é endémica como o Brasil, Bangladesh, índia ou Nepal.

Apesar de a doença de Hansen (lepra) já praticamente não existir em Portugal, vão aparecendo alguns casos de imigrantes nesta consulta do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), a única de Lisboa e do sul do país.

“A sua incidência foi diminuindo muito grandemente ao longo do século XX e, portanto, o número de doentes que temos atualmente é um número residual”, afirmou a dermatologista Cândida Fernandes, em declarações à agência Lusa a propósito do Dia Mundial de Combate à Hanseníase (lepra), que se assinala este ano em 30 de janeiro.

Segundo a responsável pela consulta, surgem por ano “um, dois, três, quatro novos casos, no máximo, por ano” de pessoas nascidas no estrangeiro, notando que há mais de cinco anos que não surgem novos casos de doentes portugueses.

“Em termos gerais devemos seguir entre 30 a 40 doentes por ano, sendo que a maior parte deles já fez o tratamento e está só em vigilância”, adiantou.

Os novos doentes atualmente seguidos nesta consulta são sobretudo do Brasil, do Bangladesh, da índia, do Nepal., mas também temos alguns doentes dos países africanos de expressão portuguesa.

Alguns começam a ter manifestações da doença já em Portugal, onde são diagnosticados. Outros chegam já com o diagnóstico feito para completar o tratamento no país onde passaram a viver.

“Mais raramente são doentes que têm as complicações da doença, as lesões neurológicas, episódios febris e aparecimento de manifestações cutâneas”, referiu.

A médica frisou que se consegue tratar a maior parte dos doentes sem que fiquem com sequelas muito marcadas, “mantendo a funcionalidade, o seu emprego e a capacidade de usar as mãos e os pés sem grandes sequelas”.

A maior parte dos doentes acompanhados na consulta tem entre 30 e 40 anos, mas houve dois casos em que a doença apareceu na adolescência. “Isso foi muito traumatizante e condicionou muito o desenvolvimento destes miúdos e deixou sequelas importantes”, lamentou.

Há doentes que são acompanhados no hospital há mais de 20 anos, mas, explicou: “É mais porque ficaram com o estigma da sua doença e com receio de que a doença volte e então procuram-nos, no fundo, para ter certeza que aquilo que surgiu não é uma recidiva da doença de Hansen”.

“São situações muito dramáticas sobretudo nas pessoas que tiveram a doença e que ainda se lembram”, afirmou, contando que os doentes nunca dizem que têm lepra.

“O estigma é muito marcado e nós até lhes ensinamos algumas estratégias para se protegerem um bocado porque é uma doença que ainda tem uma reminiscência de um estigma que não passou e como se fala pouco ainda piora sempre um bocadinho”, referiu.

A consulta dos Capuchos foi formada no seguimento da Consulta de Hansen do Hospital Curry Cabral, em Lisboa, que foi criada no serviço de dermatologia depois do encerramento das leprosarias que existiram até aos anos 50, como a que funcionou no Hospital Rovisco Pais, na localidade da Tocha, no distrito de Coimbra, onde os doentes eram internados compulsivamente.

“É uma consulta que existe já há muitos anos para o diagnóstico, seguimento e tratamento dos doentes com doença de Hansen” causada pela bactéria ‘Mycobacterium leprae’ que afeta a pele e o sistema nervoso periférico.

O tempo de incubação da doença é muito longo: “O doente entre ser infetado e ter as manifestações cutâneas [manchas na pele] pode demorar muitos anos”.

Como a doença afeta os nervos periféricos, que dão sensibilidade à dor, o que acontece é que os doentes se não sentem a dor, fazem feridas e isso provoca traumatismos, lesões.

Com o avançar da doença, se não for tratada, podem surgir úlceras de perna e até perder as terminações dos dedos.

Cândida Fernandes salientou que existe tratamento para a doença (três antibióticos diferentes), que é fornecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) a todos os doentes para que “a lepra se torne uma doença cada vez mais rara e que seja cada vez menos um problema”.

Para a médica, deve olhar-se para a lepra com “toda a riqueza da sua história, mas também com esperança de que é uma doença que se trata”.

“Os doentes com o seguimento adequado conseguem viver a sua vida sem preocupação e sem sequelas e tratando-se também diminui muito a transmissão da doença na população e sobretudo nas pessoas mais próximas e isso é uma coisa muito importante”, concluiu.

Todos os anos surgem cerca de 200 mil novos casos de lepra em todo o mundo, segundo dados das Nações Unidas.

LUSA/HN

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