Fechar o país “seria absolutamente insuportável”

27 de Setembro 2020

O ex-ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes considerou que fechar o país “seria absolutamente insuportável” e apelou à união “entre todos” e ao alinhamento do “discurso político com a realidade” para se chegar à primavera com alguma estabilidade.

“Temos pela frente, seguramente, três, quatro meses muito difíceis e é nessa dificuldade que temos de trabalhar em união entre todos, alinhando sempre o discurso político com a realidade, gerindo bem as expectativas das pessoas, não dramatizando, nem assustando, mas também não desvalorizando os riscos que temos pela frente”, afirmou, em declarações à agência Lusa.

Apesar dos próximos meses serem “seguramente muito difíceis” porque coincidem com o inverno e com outras infeções respiratórias, o especialista em Saúde Pública acredita que o país tem condições “de chegar à primavera do próximo ano num quadro de alguma estabilidade, que permita relançar o país sem o fechar agora, porque o encerramento agora seria, de facto, absolutamente insuportável”.

Para Adalberto Campos Fernandes, a grande preocupação são “os doentes que estão sem tratamento por causa da fixação ou da concentração de recursos” na reposta à covid-19 que, no seu entender, “é excessiva” nalguns casos.

“Não dá para esperar mais”, considerou o antigo ministro da Saúde (2015 e 2018), que falava à Lusa a propósito do agravamento da situação epidemiológica da covid-19.

“Temos de ter uma estratégia de abertura do sistema, quer na área pública do SNS, quer com a colaboração do setor social e privado, e temos de recuperar rapidamente a resposta que está atrasada de pessoas que têm as doenças crónicas ou agudas que nada têm a ver com a covid e precisam de ser atendidas”, defendeu.

Para isso, é preciso que todos colaborem para que “estes quatro ou cinco meses não venham agravar aquilo que já foi negativo na acumulação de atrasos” desde março.

Sobre o agravamento da pandemia, o especialista disse que “não é nada de muito surpreendente”: “o que se está a passar em Portugal e na Europa é natural porque nós não temos imunidade estabelecida, não temos vacina e, portanto, temos uma população que, de uma forma geral, está suscetível a este tipo de infeção”.

À medida que o país foi abrindo depois do confinamento “era inevitável” que houvesse um aumento do número de casos.

Questionado se o país pode voltar a ter cerca de 30 mortos por dia por covid-19 como aconteceu em abril, considerou ser “muito improvável”.

“Em março e abril os países, de uma forma geral, foram apanhados desprevenidos” e “a resposta de saúde foi confrontada com uma situação nova e pouco conhecida”, mas desde então estabeleceu-se “uma curva de experiência nos profissionais de saúde, ou seja, os médicos têm hoje uma compreensão mais aprofundada da doença”.

Embora ainda não haja vacina, existem algumas abordagens terapêuticas que permitem que a morbilidade da doença seja melhor gerida e, por outro lado, as populações aprenderam “os melhores comportamentos” e estratégias para evitar a propagação da infeção.

“O objetivo de todos os países, e penso que de Portugal também, é que independentemente de o número de casos aumentar, até por via de um acréscimo dos testes, que devem ser feitos maciçamente, nós tenhamos a letalidade a baixar, que é o que tem vindo a acontecer”, declarou.

Importa reduzir o impacto na mortalidade e na morbilidade, através de “uma proteção inteligente dos grupos mais vulneráveis”, e gerir com “inteligência as cadeias de transmissão” para impedir que o crescimento de casos que vai haver “seja desordenado e possa, por isso, haver danos colaterais em pessoas mais suscetíveis”.

Sobre as recomendações que deixaria, Adalberto Campos Fernandes disse que as regras são tanto mais eficazes quanto mais simples forem”, aconselhando a adoção das medidas de saúde pública com “grande responsabilidade individual”.

“É aprender a viver com esta situação nos próximos quatro meses, não a desvalorizando seguramente, mas também não criando uma hipervalorização que efetivamente não ajuda em nada”.

LUSA/HN

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

Projeto IDE: Inclusão e Capacitação na Gestão da Diabetes Tipo 1 nas Escolas

A Dra. Ilka Rosa, Médica da Unidade de Saúde Pública do Baixo Vouga, apresentou o “Projeto IDE – Projeto de Inclusão da Diabetes tipo 1 na Escola” na 17ª Edição dos Prémios de Boas Práticas em Saúde. Esta iniciativa visa melhorar a integração e o acompanhamento de crianças e jovens com diabetes tipo 1 no ambiente escolar, através de formação e articulação entre profissionais de saúde, comunidade educativa e famílias

Percursos Assistenciais Integrados: Uma Revolução na Saúde do Litoral Alentejano

A Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano implementou um inovador projeto de percursos assistenciais integrados, visando melhorar o acompanhamento de doentes crónicos. Com recurso a tecnologia digital e equipas dedicadas, o projeto já demonstrou resultados significativos na redução de episódios de urgência e na melhoria da qualidade de vida dos utentes

Projeto Luzia: Revolucionando o Acesso à Oftalmologia nos Cuidados de Saúde Primários

O Dr. Sérgio Azevedo, Diretor do Serviço de Oftalmologia da ULS do Alto Minho, apresentou o projeto “Luzia” na 17ª Edição dos Prémios de Boas Práticas em Saúde. Esta iniciativa inovadora visa melhorar o acesso aos cuidados oftalmológicos, levando consultas especializadas aos centros de saúde e reduzindo significativamente as deslocações dos pacientes aos hospitais.

Inovação na Saúde: Centro de Controlo de Infeções na Região Norte Reduz Taxa de MRSA em 35%

O Eng. Lucas Ribeiro, Consultor/Gestor de Projetos na Administração Regional de Saúde do Norte, apresentou na 17ª Edição dos Prémios de Boas Práticas em Saúde os resultados do projeto “Centro de Controlo de Infeção Associado a Cuidados de Saúde na Região Norte”. A iniciativa, que durou 24 meses, conseguiu reduzir significativamente a taxa de MRSA e melhorar a vigilância epidemiológica na região

Gestão Sustentável de Resíduos Hospitalares: A Revolução Verde no Bloco Operatório

A enfermeira Daniela Simão, do Hospital de Pulido Valente, da ULS de Santa Maria, em Lisboa, desenvolveu um projeto inovador de gestão de resíduos hospitalares no bloco operatório, visando reduzir o impacto ambiental e económico. A iniciativa, que já demonstra resultados significativos, foi apresentada na 17ª Edição dos Prémios de Boas Práticas em Saúde, promovida pela Associação Portuguesa de Desenvolvimento Hospitalar

Ana Escoval: “Boas práticas e inovação lideram transformação do SNS”

Em entrevista exclusiva ao Healthnews, Ana Escoval, da Direção da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar, destaca o papel do 10º Congresso Internacional dos Hospitais e do Prémio de Boas Práticas em Saúde na transformação do SNS. O evento promove a partilha de práticas inovadoras, abordando desafios como a gestão de talento, cooperação público-privada e sustentabilidade no setor da saúde.

Reformas na Saúde Pública: Desafios e Oportunidades Pós-Pandemia

O Professor André Peralta, Subdiretor Geral da Saúde, discursou na 17ª Edição dos Prémios de Boas Práticas em Saúde sobre as reformas necessárias na saúde pública portuguesa e europeia após a pandemia de COVID-19. Destacou a importância de aproveitar o momento pós-crise para implementar mudanças graduais, a necessidade de alinhamento com as reformas europeias e os desafios enfrentados pela Direção-Geral da Saúde.

Via Verde para Necessidades de Saúde Especiais: Inovação na Saúde Escolar

Um dos projetos apresentado hoje a concurso na 17ª Edição do Prémio Boas Práticas em Saúde, uma iniciativa da Associação Portuguesa de Desenvolvimento Hospitalar, foi o projeto Via Verde – Necessidades de Saúde Especiais (VVNSE), desenvolvido por Sérgio Sousa, Gestor Local do Programa de Saúde Escolar da ULS de Matosinhos e que surge como uma resposta inovadora aos desafios enfrentados na gestão e acompanhamento de alunos com necessidades de saúde especiais (NSE) no contexto escolar

Projeto Utente 360”: Revolução Digital na Saúde da Madeira

O Dr. Tiago Silva, Responsável da Unidade de Sistemas de Informação e Ciência de Dados do SESARAM, apresentou o inovador Projeto Utente 360” na 17ª Edição dos Prémios de Boas Práticas , uma iniciativa da Associação Portuguesa de Desenvolvimento Hospitalar (APDH). Uma ideia revolucionária que visa integrar e otimizar a gestão de informações de saúde na Região Autónoma da Madeira, promovendo uma assistência médica mais eficiente e personalizada

MAIS LIDAS

Share This