Novas investigações revelam que continuam a existir disparidades significativas na vacinação infantil. Na maioria dos países, as crianças mais pobres de grupos sub-representados e minoritários, correm maior risco de não receberem todas as vacinas recomendadas.
Um suplemento especial do “American Journal of Preventive Medicine”, publicado pela Elsevier, analisa as barreiras e os desafios que limitam ou impedem o acesso de crianças vulneráveis às vacinas.
“Melhorar o acesso das crianças às vacinas, em todo o mundo, é fundamental para alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável da Organização Mundial de Saúde (OMS), que visa a obtenção de progressos contínuos na redução da mortalidade global em crianças menores de cinco anos”, explicam os Guest Editors Matthew L. Boulton e Abram Wagner, ambos do Departamento de Epidemiologia da Escola de Saúde Pública, e do Instituto Global para a Equidade das Vacinas da Universidade de Michigan (Estados Unidos). “Vai ter de existir um esforço e um investimento mais sustentado por parte dos governos de todo o mundo para colmatar a lacuna das desigualdades na vacinação infantil”.
O Dr. Boulton e o Dr. Wagner assinalam que compreender quem recebe a vacina pode ajudar a planear programas dirigidos à prevenção de futuros surtos de doenças evitáveis, como a Covid-19. Contudo, o momento em que a vacinação ocorre também é importante.
Os atrasos na vacinação deixam as crianças vulneráveis à doença. Um estudo efetuado com crianças da África Subsariana abordou questões como a vacinação atempada e as desigualdades em termos de saúde familiar, educação materna e local de residência. Os investigadores relatam que mais de metade das crianças receberam uma ou mais vacinas com mais de um mês de atraso. A vacinação atempada foi consistentemente mais elevada em crianças de mães educadas, nos lares mais ricos e nas áreas urbanas.
“As nossas conclusões sugerem que para reduzir a desigualdade na cobertura vacinal atempada, os prestadores de saúde e os decisores políticos devem conceber intervenções de saúde que incluam uma perspetiva de igualdade”, diz Martin K. Mutua, do “African Population and Health Research Center”, em Nairobi (Quénia) e investigador principal do estudo “Inequities in On-Time Childhood Vaccination: Evidence From Sub-Saharan Africa”. Na sua perspetiva, “deveria haver mais campanhas de sensibilização nas zonas onde vivem os mais pobres e nas localidades rurais. Clínicas de saúde móveis com horários flexíveis dirigidas a estas populações, podem ajudar a reduzir o fosso de desigualdade”.
As intervenções de saúde têm geralmente um padrão “pró-rico”: são mais frequentemente adaptadas às necessidades dos ricos do que dos indivíduos pobres. No entanto, a perda de confiança do público nas vacinas e a crescente atenção aos movimentos antivacinação estão mais frequentemente associadas a países com rendimentos mais elevados.
A “hesitação de vacinar” é uma das 10 principais ameaças à saúde identificadas pela OMS e pode desempenhar um papel mais importante no futuro. Os investigadores procuraram determinar se a hesitação de vacinar pode estar a surgir entre os ricos dos países de rendimento médio-baixo, e qual poderá ser o impacto na cobertura vacinal.
“Verificámos que o clássico padrão de desigualdade pró-rico, em que os ricos apresentam melhor cobertura vacinal do que os pobres, parece estar a mudar, especialmente nos países de rendimento médio-alto. O número de países que apresentam o padrão clássico de desigualdade pró-rico diminuiu à medida que o rendimento nacional aumentava. Esta mudança pode dever-se à hesitação de vacinar entre as famílias ricas”, sugere o investigador Cesar G. Victora, co-autor do estudo “Patterns in Wealth-related Inequalities in 86 Low- and Middle-Income Countries: Global Evidence on the Emergence of Vaccine Hesitancy”.
“Cada vacina exige um nível mínimo de cobertura para garantir a imunidade da comunidade”, explica o investigador. “É necessário ter uma atenção especial para prevenir a hesitação de vacinar em países de médio-baixo rendimento”.
A hesitação de vacinar não se limita aos ricos. Os estudos abordam a hesitação de vacinar com base em crenças religiosas e entre os migrantes de menores rendimentos numa área urbana.
O Dr. Boulton e o Dr. Wagner assinalam que assegurar o acesso às vacinas para a Covid-19 em grupos historicamente marginalizados, será importante para assegurar a cobertura universal necessária para erradicar a pandemia. “A distribuição desigual de uma vacina para a Covid-19 reforçará e aprofundará ainda mais as disparidades existentes e contribuirá para as lacunas substanciais que atualmente existem a nível mundial na doença pandémica e na morte”, diz o Dr. Wagner.
Ambos os especialistas sugerem que esta investigação pode ajudar as discussões atuais e futuras sobre a equidade global no acesso às vacinas e contribuir para a realização da visão da OMS de um mundo em que todos possam beneficiar de vacinas para melhorar a saúde e o bem-estar.
Mais informação em:
American Journal of Preventive Medicine, volume 60, issue 1, supplement 1 (January 2021), published by Elsevier. https://www.ajpmonline.org/issue/S0749-3797(20)X0012-2.
The featured articles are:
“Inequities in On-Time Childhood Vaccination: Evidence From Sub-Saharan Africa,” by Martin K. Mutua, PhD, Shukri F. Mohamed, MPH, Julia M. Porth, MPH, and Cheikh M. Faye, PhD (https://doi.org/10.1016/j.amepre.2020.10.002)
“Patterns in Wealth-related Inequalities in 86 Low- and Middle-Income Countries: Global Evidence on the Emergence of Vaccine Hesitancy,” Bianca de O. Cata-Preta, MSc, Fernando C. Wehrmeister, PhD, Thiago M. Santos, BEng, Aluísio J.D. Barros, PhD, and Cesar G. Victora, MD (https://doi.org/10.1016/j.amepre.2020.07.028)
NR/HN/Adelaide Oliveira
0 Comments