Medidas sanitárias “excessivas” em França não devem impedir retoma económica

30 de Agosto 2020

A ‘rentrée’ em França está a ser marcada por um agravamento do número de casos de covid-19, mas também um endurecimento das medidas sanitárias que podem ter impacto na retoma económica no país, considera o economista Pascal de Lima.

“Parece que o vírus mudou e é menos perigoso. As pessoas já se podem testar. O que é importante é que as medidas de prevenção excessivas não venham travar a retoma económica”, disse á agência Lusa Pascal de Lima, economista-chefe na Harwell Management e professor na Sciences Po Paris.

A imposição da utilização da utilização da máscara nas escolas básicas e liceus, no local de trabalho – a não ser que se trabalhe num escritório sozinho – e nalgumas cidades tanto nos espaços interiores como exteriores – nesta ‘rentrée’ pode ser uma medida “um pouco exagerada” e traz um custo acrescido às famílias e às empresas.

“É preciso dizer que estas obrigações representam um custo por trabalhador para as pequenas e médias empresas que pode ir até 10.000 euros por ano. Ou seja, 100 mil euros caso a empresa tenha 10 trabalhadores. É enorme”, salientou Pascal de Lima.

Após um confinamento severo, a França introduziu medidas como o desemprego parcial, adiamento das contribuições da empresas e empréstimos com garantia do Estado, em modo de sobrevivência, mostrando-se como o país mais generoso da União Europeia.

“É importante perceber que esse era um plano de apoio e ainda não um plano de relance económico e isso quer dizer que ainda estamos em modo de sobrevivência. A França mostrou estar na linha da frente desses esforços, mas ainda não é o plano de relance e esse terá de ser setorial”, afirmou o economista de origem portuguesa.

O Governo francês vai anunciar o seu plano de relance da economia no dia 03 de setembro dispondo para isso de uma verba de 100 mil milhões de euros, que serão repartidos entre reindustrialização, transição ecológica, emprego e solidariedade social.

Pascal de Lima, que publicou recentemente o livro “Capitalismo e tecnologia: as ligações perigosas, a caminho das profissões do futuro”, defende que o vírus deve ser visto como uma oportunidade para mudar estruturalmente a economia e o mercado de trabalho.

“Temos uma oportunidade excecional para finalmente haver uma viragem do mercado de trabalho e dar espaço a todas as profissões que integram inovações como robótica e inteligência artificial. Deve-se também ter em atenção as profissões liberais e proteger as profissões de subsistência como os empregados de mesa ou serviços às pessoas”, defendeu Pascal de Lima.

Em julho, a França tinha 2,4 milhões de pessoas em desemprego parcial e o primeiro-ministro assegurou que a medida seria apoiada pelo Estado nalguns setores até pelo menos início de novembro. No entanto, muitos destes postos de trabalho podem desaparecer.

“Vemos já falências importantes, sobretudo no setor automóvel. Há profissões que vão ter dificuldade a recuperar e setores que vão desaparecer. Penso em muitas profissões ligadas à restauração onde o clima é pessimista, mesmo com ajudas do Estado”, disse o economista, que antecipa a precarização do mercado de trabalho francês até 2021.

Quanto à dívida francesa, que vai já nos 121% do seu PIB, a única forma de a tornar sustentável é lançar novos projetos.

“O Estado vai ter de encontrar margem de manobra para a sustentabilidade da dívida pública e isso é um trabalho difícil porque é preciso haver verdadeiros projetos no país, possivelmente ligados ao ambiente e à inovação”, concluiu Pascal de Lima.

LUSA/HN

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