Consulta de doenças sexualmente transmissíveis nos Capuchos com procura crescente

12 de Setembro 2021

A Consulta de Doenças Sexualmente Transmissíveis no Hospital dos Capuchos é cada vez mais procurada por portadores de doenças como a sífilis e gonorreia, que aumentam à medida que diminui o medo da sida e o uso do preservativo.

A funcionar em regime de “porta aberta”, acolhendo utentes de todo o país de forma gratuita, esta consulta do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), a primeira criada nestes moldes em meio hospitalar, tem vindo a crescer todos os anos, inclusive em 2020, ano em que começou a pandemia de covid-19.

“No ano passado, todas as consultas reduziram a sua produção, exceto as diretamente relacionadas com a covid-19 e a consulta de infeções sexualmente transmissíveis”, que até aumentou em relação ao ano anterior, disse à agência Lusa Maria João Paiva Lopes, responsável pela especialidade de Dermatovenereologia do CHULC.

Até ao final de agosto deste ano, foram realizadas 2.857 consultas e, em todo o ano de 2020, 3.673, sendo a maioria homens, respetivamente, 1.873 e 2.970.

“Tem vindo a aumentar todos os anos e neste também já ultrapassámos largamente os números do ano anterior no período homólogo”, afirma Maria João Paiva.

Habitualmente nos dias da consulta, que se realiza à terça e à quinta-feira, forma-se uma fila à porta porque o atendimento é por ordem de chegada e as portas abrem às 08:00, hora em que começam a ser recebidos, primeiro pela administrativa, e depois pela equipa médica e de enfermagem.

Médica há mais de 20 anos nesta consulta que resultou de outros serviços de Dermatologia dos hospitais do Desterro e Curry Cabral, Cândida Fernandes explicou que os utentes não necessitam de marcação prévia para serem atendidos.

“É uma consulta que está aberta a todas as pessoas, não precisam estar sequer inscritas no Serviço Nacional de Saúde, portanto, estrangeiros, imigrantes ilegais e os residentes de todas as áreas podem sempre vir que são bem-vindos”, salientou a responsável pela Consulta de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST).

Segundo a dermatologista, os diagnósticos mais frequentes e que são “cada vez mais” são a gonorreia, a sífilis e a infeção pelo Vírus do Papiloma Humano (HPV), enquanto a clamídia e a infeção por VIH não são tão frequentes.

Com o aparecimento da penicilina houve “uma diminuição drástica” da sífilis e da gonorreia para a qual também contribuiu o surgimento do VIH, que era uma infeção mortal e gerou uma mudança de comportamentos.

“Os tratamentos antirretrovirais, que felizmente surgiram e são extremamente eficazes, tornaram o VIH uma doença crónica em que as pessoas vivem a sua vida com perfeita saúde física, emocional e sexual e, portanto, a preocupação com a infeção VIH tornou-se menos premente e houve uma diminuição das medidas de precaução”, explicou Cândida Fernandes.

Devido a esta mudança, disse, “tem havido um recrudescimento cada vez mais acentuado, nesta fase, das infeções sífilis, clamídia e gonorreia”.

Desde 2008 que João (nome fictício) é seguido nesta consulta, na altura ainda no Hospital Curry Cabral, onde faz periodicamente análises e se desloca quando tem algum sintoma ou esteve exposto a uma DST.

“Eu percebo que atendem imensa gente e é cada vez mais importante, porque quanto mais rapidamente se identificar alguma DST, mais fácil se pode ajudar a pessoa e conter a transmissão para outras pessoas”, disse João, que teve conhecimento desta consulta através da médica infeciologista que o segue no Curry Cabral desde 1998, altura em que soube que era seropositivo.

Na sua opinião, deveria haver mais informação sobre estas doenças porque está a utilizar-se “menos preservativos devido à PrEP [profilaxia pré-exposição da infeção por VIH]”.

“Acho que neste momento há mais probabilidade de se contrair as outras DST porque se criou a ideia de que há um comprimido que previne a infeção ou a transmissão por VIH e depois sentem-se protegidos e imunes, mas existem outras DST que são complicadas”, alertou.

Contou que “raramente” encontra um parceiro que esteja disposto a usar preservativo e que às vezes acabava por arriscar o que o leva a recorrer à consulta com receio de ter contraído uma infeção e de poder transmiti-la a outra pessoa, o que iria fazê-lo sentir-se “muito culpado”.

“Eu neste momento só arrisco quando tenho confiança na pessoa e mesmo assim já estou a correr um risco”, desabafou à Lusa.

LUSA/HN

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