Em declarações à agência Lusa, Vítor Neves, presidente da Europacolon Portugal – Associação de Apoio ao Doente com Cancro Digestivo, explicou que o apoio que a instituição prestava antes da pandemia significava cerca de 17.000 novos doentes todo os anos, numa doença que provoca cerca de 10.000 mortos por ano, e sublinhou que, depois da pandemia, “os números ainda vão ser piores”.
“Já antes da Covid o acesso a cuidados paliativos era defeituoso, havia já há uma grande carência em unidades de cuidados continuados e também paliativos. Nós estimamos que seriam necessárias cerca de 1.000 camas e nem sequer estamos lá perto”, afirmou.
“Apoio ao doente com cancro colorretal metastático: uma intervenção de cuidados paliativos” é o nome do projeto, que surge em março para assinalar o Mês Europeu da Luta Contra o Cancro do Intestino e vai dotar doentes e cuidadores de ferramentas essenciais “para lidarem com a doença numa das fases mais sensíveis das duas vidas”.
O projeto foi premiado pela Digestive Cancers Europe (DICE) e, nesta fase de lançamento, o objetivo é apoiar 30 doentes e 60 cuidadores nos distritos do Porto, Braga, Viana do Castelo, Vila Real e Bragança.
A equipa que a Europacolon terá neste projeto é composta por profissionais das áreas de oncologia, psicologia, nutrição e enfermagem. “Só não atuamos na área da alimentação e da higiene pessoal e das instalações. Mas é uma equipa multidisciplinar que vai durante dois meses fazer visitas quinzenais aos pacientes e que vai fazer um seguimento telefónico ao fim do terceiro mês”, explicou.
Se for necessário estender o projeto além deste tempo, a Europacolon diz-se disponível para o fazer.
“Os cuidados paliativos deviam chegar às pessoas a partir do momento em que o médico assistente tenha a certeza que aquela doença não vai ter possibilidade de reduzir e de ficar estável”, considerou Vitor Neves, acrescentando: “Aquilo que acontece neste momento em Portugal é que os cuidados paliativos chegam às vezes três dias antes [da morte], no próprio dia ou nas vezes depois, ou seja, não chegam”.
De acordo com a associação, o projeto pode ser replicado noutras regiões e já existem apelos dirigidos a outras entidades para que tal possa acontecer.
Para recuperar dos atrasos nos rastreios do cancro, que estiveram parados durante algum tempo na primeira fase da pandemia, a associação defendeu que deve ser criada “uma plataforma de recuperação e acompanhamento dos doentes oncológicos”.
“Mas muito rapidamente, porque a situação está a degradar-se todos os dias”, afirmou, lembrando que os cuidados de saúde primários não estão a acompanhar estes doentes pois estão “completamente vocacionados para a Covid”.
O responsável considera que é igualmente necessário “uma estratégia de emergência nacional, monitorizada e com uma campanha de informação pública associada”.
“Daqui a dois ou três anos vamos ver aquilo que ficou para trás neste ano [que passou]”,disse o Vítor Neves, acrescentando: “O rastreio do cancro do intestino é o rastreio que tem o custo mais baixo e o benefício maior e é uma pena não estar implementado”.
A intenção do projeto é que os doentes e os cuidadores adquiram mais conhecimentos: “Um doente que está em cuidados paliativos é um doente que está a prever que o fim de vida vai chegar mais cedo. É uma coisa que assusta e gera medos, quer ao doente, quer aos familiares”.
O responsável referiu-se ainda à verba que Bruxelas anunciou para a luta contra o cancro aquando do Dia Mundial do Cancro, no início deste mês, afirmando: “Mesmo que todo o dinheiro venha a ser investido em equipamentos e recursos humanos, no nosso entendimento, não vai chegar”.
Por isso, a associação defende que o Serviço Nacional de Saúde se deve organizar para que as unidades de cuidados de saúde primários, e não os hospitais, sejam de facto as “as linhas da frente” para solucionar grande parte dos problemas que hoje acabam por ser resolvidos nas urgências.
“Os diagnósticos de cancro hoje não se fazem nada nos centros de saúde, nem nos médicos assistentes, fazem-se nas urgências dos hospitais, quando as pessoas chegam lá em estado agudo e sem solução”, afirmou.
Vítor Neves disse ainda que, a partir de 01 de março, as pessoas envolvidas neste projeto vão contactar pessoalmente todos os diretores clínicos e todos os diretores do ACES (Agrupamentos de Centros de Saúde) “para lhes explicar que estão disponíveis estas ações e para falarem com os médicos assistentes, que sabem perfeitamente quem são os doentes que estão a morrer em casa”.
Lusa/HN
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