O diretor da Especialidade de Pedopsiquiatria do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC) afirmou, em entrevista à agência Lusa, não ter dúvidas de que o ambiente de medo que se vive desencadeou quadros reativos de ansiedade e depressão.
“As pessoas vivendo em stress constante, não digo que seja a causa, mas contribui certamente para um aumento dos quadros de perturbações emocionais”, considerou.
Para o chefe de equipa da Unidade da Primeira Infância do Hospital D. Estefânia, é preciso aprender a lidar com esta adversidade.
“Não vamos estar à espera de que isto vá desaparecer, que não existe. Vamos ter de lidar com isso e vamos ter que nos adaptar a isto e viver bem e procurar as coisas boas da vida mesmo que a covid ande por aí”, salientou.
Para Pedro Caldeira da Silva, a comunicação social tem “um papel fundamental de encontrar fatores de resiliência” e dar uma perspetiva de que a pandemia “não é uma ameaça terrível, que nunca mais acaba e vai estar sempre sobre nós, mas que é um facto da vida” com o qual se tem que lidar como os acidentes de automóvel ou doenças como a gripe, o cancro ou a malária.
Relativamente aos estabelecimentos de ensino, defendeu ser “muito importante encontrar uma maneira de libertar as crianças, deixá-las em paz na escola e não andar com estas coisas dos contágios, estes medos todos”, o que, no seu entender, é “completamente despropositado”.
Por outro lado, as famílias têm de apresentar e filtrar esta realidade, porque, alertou, “quando as coisas se tornam incompreensíveis para os adultos, as crianças depois também têm dificuldade a lidar com isto”.
Aludindo aos efeitos da pandemia, afirmou que os confinamentos obrigaram a algumas adaptações das crianças: “No geral, estamos muito satisfeitos por isto ter ocorrido numa altura em que havia redes sociais, porque se não houvesse podíamos falar em verdadeiro isolamento”.
Segundo o pedopsiquiatra, as crianças entre os 3 e os 6 anos serão as que terão sofrido mais isolamento, porque “já tem apetência e competência para socializar, mas não têm ainda competências para usar as redes sociais”.
Sobre se esta situação pode provocar atrasos no desenvolvimento, desvalorizou: “É um exagero, não só recuperam como o que foi pedido foi que ficassem com os pais”.
“Isso seria partir do princípio de que as famílias são completamente incompetentes e que só a escola é que dá estimulação adequada, que é uma coisa que não acredito mesmo”, comentou.
Contudo, houve muitas crianças que ficaram sujeitas a pouca interação com os pais, porque estavam “muitas horas presos ao computador, agarrados ao ecrã”.
“Os pais estão ali muito próximos, mas muito pouco disponíveis e isto é uma situação paradoxal para as crianças e que pode provocar algum sofrimento (…) mas atrasos no desenvolvimento por causa disso, em crianças com potencial de base normal, custa-me um bocado a acreditar”, explicou.
“Em crianças vulneráveis talvez, agora não sei se mais do que do que se tivessem estado numa escola qualquer”, comentou.
Pedro Caldeira da Silva destacou ainda a “oportunidade única” que os pais tiveram durante o confinamento para “conhecer melhor os filhos”.
“Tiveram mais tempo com eles e foi uma oportunidade única de uma geração que depois foi estragada pela telescola e pelo teletrabalho”, disse o pedopsiquiatra, que há 33 anos acompanha crianças e bebés no Hospital D. Estefânia.
LUSA/HN
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