Consultas de esclerose múltipla mais do que duplicaram em cinco anos no Hospital dos Capuchos

30 de Maio 2021

Mais de 100 doentes com suspeita de sofrerem de esclerose múltipla são atendidos, em média, anualmente em primeira consulta da especialidade no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, que em cinco anos mais do que duplicou o número de consultas.

A funcionar no Hospital dos Capuchos, a consulta de Esclerose Múltipla (EM), uma das maiores do país, recebe cada vez mais doentes em resultado de um diagnóstico mais célere, da sensibilização dos médicos de outras especialidades e do trabalho com as associações de doentes, disse o coordenador da consulta, Carlos Capela, que falava à Lusa a propósito do Dia Mundial da Esclerose Múltipla, assinalado hoje.

O número de doentes em tratamento modificador da doença tem vindo a aumentar, passando de 578 em 2015, para 911 no final de 2020, um crescimento também observado nas primeiras consultas e de seguimento que em 2016 totalizavam 1.867 e no ano passado 4.426.

Este crescimento foi acompanhado na atividade do Hospital de Dia que em 2016 acompanhava 310 doentes e, em 2020, 443, tendo sido recentemente submetido a um processo de melhoria dos seus processos internos pela Lean Health Portugal.

Todo este trabalho é realizado por “uma equipa jovem, motivada” que está sempre a tentar melhorar a sua organização e o atendimento em prol dos doentes, com os “poucos recursos” que tem, disse Carlos Capela.

Para melhorar a resposta, o neurologista defendeu a criação de centros de referência de tratamento desta patologia porque, às vezes, é preciso “uma grande familiarização” com os medicamentos mais eficazes.

“Tem que se ter uma estrutura hospitalar muito robusta para se monitorizar alguns efeitos secundários que estes medicamentos podem dar e geralmente essa robustez encontra-se mais em hospitais centrais, que têm mais acesso às especialidades que são necessárias no apoio a estes doentes, como infecciologia, dermatologia, neuroftalmologia, hepatologia, etc”, salientou.

Ao concentrarem-se serviços, disse, “há mais vigilância, há mais experiência, há mais segurança para o doente porque determinados medicamentos exigem programas de mitigação dos riscos que às vezes só se consegue com um determinado nível de organização dentro do serviço nacional de saúde”.

Defendeu também a importância da telemedicina para facilitar o acesso a doentes que estão mais distantes dos hospitais.

“Estamos a falar de uma população, regra geral, jovem, digitalmente culta e, portanto, a telemedicina pode em alguns casos minimizar esta distância, esta assimetria do interior em relação ao litoral etc”, vincou.

Outra questão também defendida por Carlos Capela é a possibilidade de os neurologistas especialistas em EM poderem deslocar-se a um hospital do interior.

“Por exemplo no Alentejo, concentrávamos todos os doentes em Évora e podíamos ir lá uma vez por semana dar consultas, fazer a triagem dos doentes que têm mesmo que ser seguidos em Lisboa por causa dos medicamentos mais complexos e os que podem lá ficar e ser lá observados e avaliados, estando muito atentos à atividade da doença, e quando é preciso fazer a mudança”, explicou.

No dia que assinala a EM, a segunda causa de incapacidade neurológica nos adultos jovens, afetando em Portugal 6.000 a 8.000 pessoas, Carlos Capela recordou o “marco histórico” que mudou a vida de muitos doentes: a aprovação no início deste século (2006) do Natalizumab, “um medicamento revolucionário em termos de eficácia”.

Até então, os medicamentos tinham uma eficácia ligeira e os médicos “pouco tinham” para oferecer aos doentes com EM, uma doença neurológica crónica, inflamatória e degenerativa que afeta múltiplos locais do Sistema Nervoso Central.

“O Natalizumab mudou o paradigma de como nós tratamos o doente porque passamos a ter um medicamento que quase, quase, para esta doença”, realçou.

“Tenho colegas mais velhos que quando iniciaram a sua atividade clínica nesta área não tinham medicamentos nenhuns e que diziam que a consulta era cheia de doentes em cadeira de rodas, acamados, ou apoiados em canadianas/andarilhos e hoje já são raros esses doentes”, contou.

O médico sublinhou que hoje com “as armas” que têm “é muito provável que o doente com esclerose múltipla consiga seguir em frente, ter uma vida produtiva, reprodutiva igual à população em geral”.

Apesar das muitas alternativas terapêuticas, que não são curativas, mas atrasam “a história natural da doença” ou impedem a inflamação, não há medicamentos muito eficazes para a componente degenerativa da doença que pode afetar alguns doentes.

“Estão em investigação alguns medicamentos com capacidade de remielinização, esperemos que deem frutos a curto, médio-prazo para os utilizarmos nesta doença”, salientou.

LUSA/HN

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