“Não sabemos o que poderá acontecer. Saímos de uma tremenda falta de abastecimento para voltarmos a ter o mercado abastecido (…). A disponibilidade de alimentos melhorou, mas o acesso [o poder de compra] (…) está a limitar a capacidade de comer e a incerteza de quanto é possível comer”, disse sexta-feira a nutricionista e porta-voz da Cáritas Susana Raffalli.
Em declarações à rádio católica Fé e Alegria, Raffalli explicou que na Venezuela não há dados oficiais sobre a desnutrição, mas que é possível obter estimativas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, que analisa anualmente a situação dos países sem acesso adequado a reservas alimentares.
A nutricionista disse também que a segurança alimentar das famílias tem três dimensões: a oferta no mercado, a capacidade de comprar e que os alimentos possam ser devidamente utilizados com recursos como água e gás para cozinhar, e que estejam em boas condições.
Raffalli explicou ainda que, no caso das crianças, a UNICEF tem provas da prevalência de desnutrição aguda e rápida perda de peso e de massa muscular, frequentemente causada pela falta de alimentos ou por uma doença grave.
A porta-voz disse que neste tipo de desnutrição, os meninos são visivelmente mais magros e que as meninas apresentam atraso no crescimento, por não receberem os nutrientes de que necessitam durante um longo período de tempo, resultando numa altura inferior à média.
“Estamos a ter taxas muito elevadas de atraso de crescimento. Era 12% em 2007 e agora é mais de 30%: três em cada dez crianças que chegam à Cáritas estão raquíticas. Perdeu-se a oportunidade de crescerem. E as meninas são as mais afetadas, com estatura mais baixa”, explicou Raffalli.
A Cáritas Venezuela está a analisar os dados das famílias que pediram ajuda para identificar as estratégias que implementam quando não têm nada para comer.
Perante a insegurança alimentar, 60% das famílias tinham reduzido o número de refeições por dia, assim como a quantidade de alimentos.
“Há também dados sobre a ingestão de alimentos que prefeririam não comer. Esta é uma das coisas que mais dói, porque tem a ver com a dignidade e com o facto de sentir-se respeitado”, disse.
Raffalli referiu que 52% das famílias manifestou intenção de abandonar a zona onde vivem porque esgotaram os recursos e que 70% já gastaram todas as poupanças para comprar alimentos.
A nutricionista denunciou que as caixas de alimentos a preços subsidiados, distribuídas pelo Governo, “muitas vezes não chegam em boas condições” e que alguns venezuelanos optam por comprar comida “que está prestes a decompor-se porque é mais barata”.
Raffalli recomendou ao Estado aprofundar os programas de proteção social em matéria de nutrição.
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