Governo com suporte político mais frágil e desafios da recuperação pós-covid-19

27 de Dezembro 2020

O Governo parte para 2021 com um suporte político mais frágil no parlamento, após a demarcação do BE, e com os desafios de coordenar a vacinação contra a covid-19 e promover a recuperação económico-social do país.

Com Portugal em crise sanitária, económica e social em consequência da pandemia de covid-19, o executivo liderado por António Costa teve pela primeira vez em 2020 a oposição de um ou de mais partidos à esquerda do PS em relação a propostas orçamentais que levou ao parlamento.

Em julho, a proposta de Orçamento Suplementar foi viabilizada pelas abstenções de PSD, PAN e Bloco de Esquerda, mas recebeu votos contra de PCP e PEV. António Costa optou nessa altura por desdramatizar o sentido de voto dos comunistas, considerando apenas que tinham cometido um “erro de avaliação”.

Em novembro, o Orçamento do Estado para 2021 foi viabilizado pelo PAN, novamente, e à esquerda pelo PCP e pelo PEV, mas desta vez teve o voto contra do Bloco de Esquerda, o que motivou uma reação dura do primeiro-ministro, acusando os bloquistas de se terem “posto ao fresco” numa atitude de “oportunismo” que no seu entender será penalizada pelos eleitores.

A questão do posicionamento do Bloco de Esquerda e do PCP em relação ao Governo não seria um fator tão determinante para 2021 se não fosse a linha vermelha introduzida pelo próprio primeiro-ministro e secretário-geral do PS em agosto passado, quando estabeleceu uma clara demarcação política face ao PSD. Em entrevista ao jornal Expresso, declarou: “No dia em que a subsistência deste Governo depender de um acordo com o PSD, nesse dia este Governo acabou”.

Ou seja, segundo António Costa, no dia em que acabar definitivamente a solução política de suporte parlamentar à esquerda que nasceu em novembro de 2015, o Governo deixará de ter condições para cumprir o seu mandato de quatro anos e haverá uma crise política que exigirá eleições legislativas antecipadas.

Se em relação ao PCP o Governo socialista mantém abertas as portas para o diálogo, com o Bloco de Esquerda o clima atual é de confronto, embora nenhuma das partes tenha dado ainda o divórcio como irrevogável.

Portugal entra em 2021 em situação de estado de emergência em consequência da covid-19 e, de acordo com as previsões do executivo, deverá fechar este ano económico de 2020 com uma recessão recorde de 8,5%, um défice de 7,3% e um desemprego na ordem dos 8%.

Para o Governo, a partir de agora, o primeiro desafio fundamental passa por conter a epidemia de covid-19 em níveis que não coloquem em causa a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde (SNS), contando com a vacinação prevista para começar hoje, uma gestão de expectativas difícil e um processo de grande complexidade de coordenação para as administrar.

No dia 03 de dezembro, no Infarmed, em Lisboa, quando apresentou o plano de vacinação contra a covid-19, António Costa deixou um aviso: “Há agora uma luz ao fundo do túnel, mas o túnel é ainda muito comprido e bastante penoso”.

“Portugal irá adquirir 22 milhões de vacinas, mas essa quantidade de vacinas não chega automaticamente no primeiro dia. Vão chegando escalonadamente e gradualmente ao longo de todo o ano de 2021”, declarou o líder do executivo.

Em simultâneo com a crise sanitária, o Governo tem a tarefa de executar com eficácia o Orçamento do Estado para 2021, tendo como objetivo cimeiro preservar ao máximo o aparelho produtivo e os níveis de emprego.

Em relação ao próximo ano, no plano económico, o Governo tem principalmente duas dores de cabeça: Em primeiro lugar, o Novo Banco, em que o PSD e os partidos à esquerda do PS se uniram para travar uma transferência orçamental na ordem dos 470 milhões de euros para o fundo de resolução e que deixa o Estado Português em risco de não cumprir o contrato de venda que fez com a Lone Star em 2017; e o Plano de Reestruturação da TAP, que está em análise em Bruxelas e que pode envolver cerca de dois mil despedimentos e um montante de 3,7 mil milhões de euros em auxílios até 2024.

No plano político, se a crise sanitária, económica e social se atenuar de forma clara a partir do segundo semestre de 2021, o executivo socialista acredita que terá condições para ver a sua proposta de Orçamento do Estado para 2022 viabilizada no parlamento. Para o núcleo político do Governo, caso se confirme uma conjuntura de recuperação a partir da segunda metade do próximo ano, então um cenário de crise política e de eleições antecipadas não será do interesse de nenhum dos principais partidos do sistema, sobretudo daqueles que estão à esquerda do PS.

No plano de recuperação económica e social do país, o Governo conta sobretudo com o impacto dos fundos da chamada “bazuca” europeia contra a crise. O envelope financeiro de Portugal poderá atingir os 58 mil milhões de euros até 2029, dos quais 45,1 mil milhões de euros de subvenções a fundo perdido, numa média de execução de 6,4 mil milhões de euros por ano.

No final da última reunião de chefes de Estado e de Governo, em que ficaram aprovados em definitivo o plano de recuperação económica da União Europeia e o Quadro Financeiro Plurianual (2021/2027), António Costa considerou que agora “a luz existe mesmo ao fundo do túnel”.

Outro dos grandes desafios do Governo é a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia no primeiro semestre do próximo ano, que terá precisamente como primeira prioridade a concretização do plano de recuperação europeu.

“Estamos preparados para começar no dia 01 de janeiro. A nossa primeira prioridade é precisamente arrancar com a recuperação económica com duas dimensões fundamentais: Concluir com o Parlamento Europeu todo o trabalho de aprovação dos diferentes regulamentos que são necessários para pôr em marcha o Quadro Financeiro Plurianual; e a aprovação de todos os programas nacionais de recuperação e resiliência”, disse o primeiro-ministro em Bruxelas no passado dia 11.

Nos próximos seis meses, a presidência portuguesa pretende também conferir um novo impulso ao pilar social da União Europeia – área que António Costa tem classificado como vital para o combate ao crescimento de correntes populistas e liberais na Europa.

Para os dias 07 e 08 de maio, no Porto, estão agendadas uma cimeira social e um Conselho Europeu Informal, com a aprovação de uma declaração vinculativa sobre o pilar social da União Europeia. Na perspetiva do primeiro-ministro, este será “o evento central” da presidência portuguesa.

No domínio da política externa, além do desenvolvimento das relações com África, a presidência portuguesa destaca a cimeira entre a União Europeia e a Índia, prevista para o dia 08 de maio, no Porto, com a presença de todos os chefes de Estado e de Governo europeus e do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi.

LUSA/HN

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